O painel “Educação e Formação”, da conferência digital “Saúde: Construir o Futuro”, desenvolvida pelo Conselho da Diáspora Portuguesa, composto por Gonçalo Bernardes, Professor Associado da Universidade de Cambridge, Gabriela Gomes, Professora de Matemática e Estatística na Universidade de Strathclyde (Escócia), e George Perry, da Universidade do Texas, debateu a importância da educação e formação na base de qualquer estratégia de crescimento e construção de um futuro, especificamente no que respeita à saúde, pois quem educa é responsável pelos próximos médicos, enfermeiros, cuidadores e quem pratica qualquer técnica relacionada com o bem estar humano.
A Pandemia veio mostrar quão importante é a formação multidisciplinar e a inclusão de novos atores na área da saúde, para além de realçar o emergente paradigma da prevenção da doença relacionada com a sua cura.
A compreensão dos números e a aplicabilidade dos modelos matemáticos, foi também algo realçado pela Pandemia, chamando a atenção para a forma como os programas de ensino, com destaque para a matemática (até ao 12º ano), estão, ou não, adaptados a essa realidade. Gabriela Gomes, um rosto conhecido do público com a sua presença em vários meios de comunicação social, e que durante o pico da pandemia explicou a aplicação de modelos matemáticos à evolução do cenário de saúde, refere a partir de então o aumento generalizado do interesse pela matemática – “as pessoas gostam da matemática quando isso lhes diz respeito e está próximo de si”.
A importância da matemática é hoje inequívoca, tornando evidente que através desses modelos é possível contabilizar e fazer valer o paradigma da prevenção e cura da doença – numa doença infeciosa, o peso da prevenção é amplificado pelo fato de se estar a evitar que não apenas uma, mas várias pessoas, sejam infetadas pelo vírus.
O SARS COV-2 teve um impacto em outras doenças e, segundo George Perry, um dos principais investigadores do mundo da doença de Alzheimer, veio mostrar como “as doenças não existem num vazio”. Nos EUA, o facto de a população com Alzheimer ter sido duas vezes mais afetada pelo COVID, para além da população idosa mais vulnerável, mostra a expressão do efeito desproporcional da doença, especialmente em grupos minoritários. A Pandemia revelou como a síndrome metabólica está não só relacionada com doenças cardiovasculares, como com doenças infeciosas, e isso é algo novo para a comunidade médica e científica.
A importância do pensamento crítico é um dos indicadores de desenvolvimento das sociedades, sendo que muita da capacidade e do conhecimento de um país pode-se rever na capacidade que a sociedade tem em avaliar as situações e conseguir entender o que se está a passar em diferentes áreas.
Na opinião de Gonçalo Bernardes, Portugal enfrenta um desafio na transformação de um sistema de ensino que, pelo menos até ao final do secundário, passe da educação ao conhecimento – isto é, de simplesmente “dar matéria” se passe à “transmissão de conhecimento” dando aos alunos a capacidade de pensar e resolver problemas.
Acerca do ensino da matemática nas escolas em Portugal, há efetivamente pouca exposição à matemática ao longo da educação. Para ultrapassar essas barreiras, Gabriela Gomes sugere a criação de uma disciplina de modelação de Matemática, com aplicações à Economia, às Ciências Sociais e Biologia, ou de iniciativas extracurriculares que viessem resultar numa sociedade mais completa e informada.
Há que estabelecer metas na área do ensino e formação, em especial até ao 12.º ano, para que nos próximos 20 a 30 anos a sociedade portuguesa seja mais capacitada, com mais conhecimento, capacidade de criar inovação e riqueza e com isso tornar Portugal um País mais próspero.
Parte desse desafio passa por transmitir entusiasmo pela matemática, e para isso acontecer, há que ter “entusiasmo por nós próprios”, algo que Gabriela Gomes identifica fazer falta em Portugal – a existência de um núcleo vibrante de modelação matemática, de Matemática Aplicada às Ciências Biológicas e Sociais, e um lugar onde se faça investigação da mais fundamental até à prestação de serviços em situações de crise, como foi o caso da Pandemia, e a projetos de ciência cidadã. Assim, será mais fácil “contaminar” os currículos escolares, ou seja, se não for pela força de um novo contexto dificilmente se conseguem fazer mudanças.
Uma outra forma de criar o entusiasmo pelo conhecimento, prende-se com uma nova postura da Academia em Portugal, e que na visão de Gonçalo Bernardes, passa por ter uma Universidade que não seja vista como uma escola. As universidades devem ser centros de investigação, cujos professores, a par de lecionar matérias, investigam e pesquisam, pois “quanto melhor for a minha investigação, melhor passo conhecimento às novas gerações”.
A educação não é apenas passar matéria, mas dar conhecimento, sob o ponto de vista multidisciplinar, para permitir que se usem as várias ferramentas na resolução de problemas – há também aqui uma mudança de paradigma que é necessária no ensino em Portugal. Para Gonçalo Bernardes, o futuro do Ensino passa por “tornar as nossas universidades menos escolas e mais centros de criação de conhecimento, que também ensinam.” Na opinião de George Perry, as sociedades devem evoluir assentes num sistema de educação para a saúde (dando como exemplo o fenómeno anti-vacinas), em que as pessoas optem pela informação que usa evidência com base em conclusões em vez de “news bites”. E Gabriela Gomes encerra este painel com a frase: “A Educação é a melhor vacina contra a desinformação.”