Sara Sousa é Chief Operations Officer (COO) & HR Manager da Portocargo, empresa transitária, com sede na Maia, que em 2022 atingiu uma faturação de 52 milhões de euros. “Nascida” na área da logística, já que o seu Pai, Mario Sousa, é CEO da empresa, a expressão “filho de peixe, sabe nadar” assenta-lhe bem, mas o caminho que fez foi fruto das suas escolhas, convicções e motivação.
Há 33 anos a operar na gestão logística internacional por via aérea, marítima e terrestre, a Portocargo, hoje integrada no grupo francês BBL Groupe, conta com cerca de 40 colaboradores em que a média de antiguidade na empresa é de 15 anos.
A trabalhar na empresa desde 2005, onde começou como Assistente Administrativa, Sara Sousa partilhou com a Líder a sua paixão pela gestão de pessoas, os desafios para atrair o talento e o sentido da verdadeira felicidade no trabalho.
Encontrar, manter e motivar as pessoas é neste momento o maior desafio das empresas. Como evitar que os melhores saiam e como encontrar o talento?
Na Portocargo, temos um grande foco na retenção de talento. A nossa área de atividade exige forte especialização, pelo que investimos continuamente na formação, qualificação e motivação dos nossos quadros. Nesta ótica, procuramos promover uma cultura de Equipa muito forte, assente num modelo de trabalho participativo e transparente, onde cada elemento tem capacidade de se fazer ouvir. A proximidade é um dos eixos essenciais desta política, conjugada com a autonomia e responsabilização. A importância atribuída à cultura corporativa reflete-se na frequência com que a empresa dinamiza iniciativas de team building, bem como atividades de valorização dos colaboradores, nomeadamente em efemérides, ou no aniversário da empresa. Privilegiámos planos de carreira ambiciosos, que permitam a progressão individual e mantenham os colaboradores motivados para atingirem novas metas e patamares de compensação. Com base nestas premissas, orgulhamo-nos de contar com uma elevada média de antiguidade na organização, que ronda os 15 anos, com diversos colaboradores a somarem mais de duas décadas de experiência connosco.
Vencer a “guerra pelo talento” exige uma experiência do colaborador mais humana. No setor da logística quais são as necessidades no que respeita à Gestão de Pessoas?
As necessidades do setor da logística não são diferentes das de outros setores de atividade. Contudo, acredito que existam dois desafios particulares. O primeiro prende-se com os elevados níveis de stress e de imprevisibilidade. Fruto dos múltiplos fatores que influenciam a nossa atividade, a regra é que surjam complicações e dificuldades nas diversas operações logísticas, o que nos impele a estar permanentemente a gerir situações com caráter de urgência. É, nesta ótica, absolutamente fundamental que possa existir um acompanhamento atento dos impactos deste cenário no bem-estar de cada colaborador, bem como no relacionamento deste com os respetivos pares, prevenindo o previsível desgaste. O outro desafio incide na escassa e insuficiente formação técnica específica para esta área. Os recém-licenciados que ingressam na área do transporte internacional têm formações bastante abrangentes e generalistas, que carecem de um significativo aprofundamento e especialização no seio das Organizações. Esta é uma prioridade para nós, conscientes do tempo e recursos que necessitamos de alocar para uma eficaz qualificação do talento jovem que temos vindo a integrar.
Entre uma pandemia e a guerra que se vive na Europa, o setor logístico passou por obstáculos e quebras significativas. O setor saiu enfraquecido, ou pelo contrário, fortalecido?
Acredito que, sobretudo na fase da pandemia, o setor logístico saiu fortalecido e acima de tudo valorizado. A verdade é que quando grande parte dos setores pararam, as empresas transitárias e transportadoras mantiveram a sua atividade, representando um papel crucial na resposta à Covid-19. Foram estas empresas, e nós tivemos a honra de ser uma delas, que permitiram abastecer os países dos EPI necessários para os hospitais e centros de saúde, e, numa fase posterior, das vacinas contra este vírus (não só em Portugal, como também para outros países). Pela forma como tais operações foram divulgadas a nível mediático, acredito que tenham sido particularmente impactantes junto da opinião pública na transmissão da importância (e da complexidade) das operações de transporte internacional.
Qual o papel da tecnologia na vossa atividade?
A tecnologia vem trazer ao setor logístico alguns elementos que considero muito relevantes, como o controlo, a digitalização, a visibilidade e a previsibilidade. O controlo ou medição (de temperatura, por exemplo) é muito relevante para o transporte de determinados produtos, desde bens alimentares a farmacêuticos, e vem trazer segurança a estas operações. A previsibilidade, que se reflete, por exemplo, no serviço de Track & Trace, permite a todos os clientes verificarem, a partir de qualquer lugar e em qualquer altura, onde se encontra a sua mercadoria e qual a data prevista de entrega. Estes são vetores da máxima importância, que incrementam a qualidade do nosso serviço e aumentam a confiança depositada nos operadores logísticos. Na Portocargo, temos investido e evoluído continuamente a nível tecnológico, com a consciência de que todos os players que pretendam continuar a operar na cadeia logística necessitarão de dar respostas eficazes e céleres às crescentes exigências e necessidades dos clientes.
Como avalia a relação Homem-máquina neste setor?
Considero que, no setor logístico, a relação Homem-máquina é de profunda sinergia. A tecnologia vem, conforme referia acima, melhorar um conjunto de procedimentos e operações, permitindo incrementar a confiança e a produtividade. Isso é particularmente verdade para as tarefas de armazém, por exemplo. Contudo, determinadas operações, como a própria coordenação da operação, que implica o diálogo permanente com um conjunto vastíssimo de stakeholders envolvidos na mesma, nunca poderão ser realizadas por uma ferramenta de AI e necessitarão sempre de intervenção humana.
Quais são para si os traços essenciais para uma liderança de pessoas, que seja positiva e eficaz?
Destaco, à cabeça, três características que considero fundamentais num líder: ser resiliente, inspirador e justo. Depois, acredito ser essencial que o líder adote uma abordagem centrada nas soluções, com um foco positivo e expectativas otimistas sobre o futuro. Esta atitude é fundamental para contagiar os colaboradores que o rodeiam, em oposição ao autoritarismo que há algum tempo se associava a uma liderança forte. Do ponto de vista operacional, enunciava três vetores que acredito contribuírem decisivamente para uma dinâmica de trabalho positiva e produtiva: deve partilhar conhecimento, procurando promover colaboradores autónomos e responsáveis; deve demonstrar boa capacidade de comunicação, sendo assertivo e eficaz nos feedbacks (para que os colaboradores saibam onde estão, e onde se deseja que cheguem) e deve assegurar inteligência emocional. Um líder guia e inspira, pelo que é essencial que demonstre controlo nos diversos momentos das relações interpessoais, gerindo expressões e emoções.
O que realmente importa quando escolhemos um trabalho ou uma profissão?
Hoje, não tenho qualquer dúvida daquele que deverá ser o principal vetor na decisão de um novo emprego: o sentimento de realização. Face ao número de horas que passamos no local de trabalho, e ao impacto do que ali acontece no nosso equilíbrio e bem-estar, é fundamental que nos possamos sentir valorizados e motivados, contribuindo para uma felicidade que inerentemente implica a satisfação na vida pessoal e na profissional. Nesta ótica, é crucial que na procura de emprego sejam considerados diversos fatores que vão para lá do salário. A análise da função, das expetativas e objetivos da mesma, conjugada com o perfil da empresa e a forma como esta perceciona a experiência do colaborador, são decisivos para uma escolha acertada e que se reflita numa atividade diária motivadora.
Qual a sua perspetiva sobre o futuro da Gestão de Pessoas?
Temos assistido a uma mudança de paradigma no que diz respeito à gestão de pessoas, porque as necessidades dos jovens de hoje não são as mesmas daqueles de há 30 anos. Os gestores que queiram reter os quadros qualificados motivados vão ter de olhar para a retenção de talentos da mesma forma que percecionam as análises financeiras. Essa atitude implica a consciência de que não será possível atingir resultados e ser uma empresa eficiente sem equipas motivadas e verdadeiramente felizes. Felizes, um termo que sei que muitos gestores não gostam de ver associados às empresas, mas os dados são absolutamente claros. Colaboradores felizes são mais produtivos e mais eficientes, apresentando menor turnover e absentismo, tendo por isso impacto direto nos resultados financeiros das empresas.
Na minha opinião, há enormes desafios de diversa ordem: 1 – Gerir colaboradores com diferentes necessidades (o gap geracional implica a consciência de que nos deparamos com realidades/objetivos muito distintos, em função das diferentes faixas etárias); 2 – Engagement – conseguir envolver os colaboradores na dinâmica e estratégia da empresa, mantendo-os comprometidos e motivados para atingir os objetivos coletivos; 3 – Retenção de talentos – dos maiores desafios nesta aérea, será sem dúvida a capacidade de assegurar a permanência dos talentos.
A gestão de talentos tem de fazer parte da abordagem estratégica da empresa. Para tal, as organizações devem criar metodologias internas que lhes permitam identificar quais os colaboradores core da empresa, identificar esses talentos como sendo parte da sua estratégia e criar um plano de desenvolvimento individual. Isto é essencial num período em que as Pessoas querem saber, de forma clara, a sua importância e as expetativas que existem em relação à sua evolução futura. Esta gestão eficaz dos planos de gestão de carreira será, na minha ótica, a única estratégia capaz de assegurar uma efetiva retenção dos talentos.