O planeta está a tornar-se cada vez mais acessível para todos, mas há ainda muito a ser feito para 11% da população portuguesa, que vive com pelo menos uma incapacidade. Segundo a Organização Mundial de Saúde, estima-se que 1,3 mil milhões de pessoas no Mundo sofram de uma deficiência significativa.
No que ao mercado de trabalho diz respeito, a inclusão de pessoas com deficiência tem conquistado relevância estratégica nas empresas portuguesas, especialmente após a entrada em vigor da legislação que estabelece quotas obrigatórias: as empresas privadas com mais de 75 colaboradores devem integrar, no mínimo, 1% de trabalhadores com incapacidade igual ou superior a 60%. Para as empresas com mais de 250 colaboradores, essa percentagem sobe para 2%.
A base de dados de profissionais com deficiência aumentou 352% nas empresas portuguesas em 2024, de acordo com dados da Michael Page. No mesmo período, registou-se um crescimento de 221% nas ofertas de emprego destinadas a pessoas com Atestado Multiusos de Incapacidade (AMI), evidenciando um crescente interesse na integração deste grupo nas empresas.
Ontem assinalou-se o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência e, a propósito das questões que envolvem esta comunidade, a Líder falou com Salvador Mendes de Almeida, Fundador da Associação Salvador, uma ONG portuguesa focada em promover a inclusão e qualidade de vida de pessoas com deficiência motora.
Que importância tem uma efeméride como o Dia Internacional das Pessoas com Deficiência na atualidade?
O Dia Internacional da Pessoa com Deficiência é uma oportunidade crucial para promover a reflexão e a consciencialização sobre os desafios enfrentados por milhões de pessoas em todo o mundo. Atualmente, a data mantém-se extremamente relevante porque, apesar da sociedade estar mais atenta a temas como as acessibilidades e inclusão, ainda existem inúmeras barreiras sociais, físicas e culturais que limitam a plena participação das pessoas com deficiência na sociedade.
Este dia, permite dar visibilidade à importância de criar políticas inclusivas e de um trabalho contínuo na promoção da igualdade de oportunidades. Este é um momento importante para reforçar o compromisso coletivo com os direitos das pessoas com deficiência, mostrando que a inclusão é essencial para termos uma sociedade mais justa, acessível e equitativa.
Como é a acessibilidade para Pessoas com Deficiência em Portugal? Que caminho tem sido feito e falta fazer?
Em pleno século XXI, continuamos a encontrar um país repleto de barreiras. Todos os dias, centenas de pessoas com deficiência motora veem-se impossibilitadas de ir trabalhar, estudar, ir a um supermercado ou mesmo ao tribunal, por falta de acessibilidades. Sejam umas escadas, um elevador avariado, um passeio mal rebaixado ou uma rede de transportes acessíveis inexistente, tornam-se verdadeiras barreiras, que privam as pessoas da sua liberdade.
As mudanças acontecem, mas muito devagar. A falta de fiscalização por parte das entidades competentes é preocupante e as Câmaras Municipais, na sua maioria, não têm um Plano de Acessibilidades definido. Os técnicos das autarquias estão pouco sensibilizados e têm pouco conhecimento sobre esta temática. Paralelamente, é necessária uma revisão da lei, que tem inúmeras lacunas e exceções. A lei não obriga a que a maioria dos espaços seja acessível, mas a mudança é urgente e, muitas vezes, simples de concretizar.
Como devem os líderes promover uma cultura organizacional de respeito e empatia em relação às pessoas com deficiência?
Os líderes desempenham um papel fundamental na criação e promoção de uma cultura organizacional que respeite e valorize as pessoas com deficiência. Para alcançar este objetivo, é essencial que assumam uma postura ativa e consciente, adotando práticas que promovam a inclusão e o respeito.
Em primeiro lugar, é importante liderar pelo exemplo. A formação, em temas como a diversidade, inclusão e acessibilidades, é uma ferramenta essencial para aumentar a consciência e capacitar os líderes a responderem de forma eficaz às necessidades de cada colaborador. Paralelamente, deve-se fomentar um ambiente de diálogo aberto.
É essencial ouvir as pessoas com deficiência e envolver estas vozes na construção de políticas e iniciativas inclusivas.
A implementação de medidas concretas, como a adaptação de infraestruturas e ferramentas de trabalho, a criação de processos de recrutamento inclusivos e a sensibilização contínua da equipa, é indispensável para transformar valores em práticas.
Uma cultura organizacional de respeito e empatia não só beneficia as pessoas com deficiência, mas também contribui para um ambiente mais coeso, inovador e produtivo para todos.
Como é que o mercado de trabalho se pode adaptar para melhor incluir esta minoria, de forma justa?
A inclusão de pessoas com deficiência no mercado de trabalho exige uma transformação estrutural e cultural, que assegure não apenas o cumprimento de leis, mas também a promoção de práticas genuinamente inclusivas e justas.
Em primeiro lugar, é crucial que as empresas adotem políticas ativas de recrutamento inclusivo, garantindo que as vagas sejam acessíveis a todos. Isto inclui a remoção de barreiras nos processos de candidatura, a adaptação de entrevistas e a disponibilização de ferramentas que permitam às pessoas com deficiência demonstrar o seu potencial em pé de igualdade.
A adaptação física dos espaços de trabalho também é essencial. Garantir acessibilidade, tanto em termos de infraestruturas, como de tecnologias, permite que as pessoas com deficiência desempenhem as suas funções com autonomia e eficiência.
Para além disso, é necessário fomentar uma cultura de sensibilização e formação dentro das organizações. Os colaboradores e líderes devem ser capacitados para compreender as necessidades específicas das pessoas com deficiência, promovendo o respeito e a empatia no ambiente laboral.
Uma outra medida fundamental é a flexibilidade nas condições de trabalho, como horários ajustáveis, trabalho remoto ou adaptações específicas ao posto de trabalho, de acordo com as necessidades individuais.
Por fim, o mercado de trabalho deve olhar para a inclusão de pessoas com deficiência não como um ato de caridade, mas como uma oportunidade de beneficiar da diversidade de talentos, ideias e perspetivas. Este é um passo essencial para construir ambientes profissionais mais justos, equitativos e inovadores, que valorizem o contributo de cada indivíduo.
A Associação Salvador tem alguma atividade agendada para assinalar esta data?
Temos várias atividades planeadas para assinalar o Dia Internacional da Pessoa com Deficiência, entre as quais a 6.ª Edição do Projeto (D) de Eficiência, uma iniciativa que promove a empregabilidade inclusiva através do trabalho em rede. Este evento, será um momento de partilha de experiências, networking e confraternização, destacando o papel das empresas e da sociedade civil na criação de oportunidades para as pessoas com deficiência.
Paralelamente, vamos dinamizar atividades em escolas e empresas, com o objetivo de sensibilizar diferentes públicos para a importância da inclusão e da igualdade de oportunidades, criando um impacto que vá além desta data. Estas iniciativas refletem o nosso compromisso em criar uma sociedade mais justa e acessível a todos, sem exceção.