Um “otimista racional” por natureza, o advogado e ex-deputado Adolfo Mesquita Nunes, defende que a automação e a Inteligência Artificial vão “tornar o mundo melhor”, mas há muito que ainda tem de ser feito.
Sobre os caminhos do futuro do trabalho, adverte que a tendência para visões distópicas e pessimistas, de que as máquinas vão substituir o Homem, é “mortal” para as empresas e para o país.
Os empregos “não são finitos, nem estáticos” e as tecnologias “livraram” as pessoas das profissões básicas, enquanto se criaram novas oportunidades “que não têm fim”. O desafio para as empresas é a criação de novos empregos dentro da organização. Ou seja, o centro da questão não é travar a automação, mas criar percursos dentro das empresas no sentido de “transformar a destruição que é esperada”.
E vai mais longe ao afirmar que a qualificação tem um papel fulcral, pois na sua visão “vamos ter a necessidade de nos reinventar ao longo da vida várias vezes”.
Se as máquinas estão para ficar como vamos reagir? Este foi o ponto de partida a talk “Future Work Knowing: os caminhos futuros da gestão empresarial”, uma intervenção onde o atual vice-presidente da Galp, desconstruiu mitos relacionados com o papel da tecnologia no mundo laboral e apontou pistas para as empresas tirarem o melhor partido da jornada de automação.
A sessão teve lugar no passado dia 23 de maio em Lisboa, no âmbito do evento Knower Business Conference.
Onde é que se enganam os pessimistas?
Segundo Adolfo Mesquitas Nunes, em todas as gerações sempre apareceu alguém a alertar para o perigo das máquinas, e que para salvar o homem temos de nos livrar delas.
“Nós não somos máquinas condenados ao contexto incapazes de reagir, de inovar e de criar. Pelo contrário, temos esta espetacular capacidade de pensar, inventar e encontrar formas de vencer os desafios”
Em 1968 Paul R. Ehrlich publicou o livro The population Bomb, onde previa o colapso do e a população condenada à pobreza, até ao final do século. Mas na prática, hoje, havendo cada vez mais gente na terra, há cada vez menos fome, o que é provado pela “redução da área alocada para a agricultura, a nível global, que, apesar do aumento exponencial da população, diminuiu de forma sustentada”, sustenta.
Isso é parte explicado pela evolução da ciência e progresso tecnológico, e sobretudo pela capacidade do “cérebro humano”, algo que os “fatalistas” não tomaram em consideração.
“A idade para pedra não ficou para trás porque se acabaram as pedras, mas sim porque a humanidade desenvolveu outras formas de produzir mais com menos”
E vai mais longe quando afirma que as taxas de desemprego e de criação de emprego na Europa, com exceção do período da Pandemia, têm-se mantido com “níveis aceitáveis e positivos”.
Como aproveitar a oportunidade da automação?
“Há um problema pois não estamos a saber aproveitar as oportunidades que existem”, alerta. Na sua perspetiva, existem dois caminhos a ser pensados sobre o futuro do trabalho dentro, e fora, das empresas.
Em primeiro lugar, a qualificação, tanto das novas gerações através do sistema de ensino, como da população ativa, através de formação profissional, e nas empresas, através da capacitação dos seus dirigentes.
“Criar condições para que os trabalhadores se possam ir qualificando ao longo da sua vida laboral é essencial sob ponto vista de políticas publicas e das empresas, e os estudos mostram que os salários aumentam e a precariedade diminuiu quando o trabalhador reforça a sua qualificação”, adverte. O papel da qualificação profissional está ausente das agendas das empresas e do programas políticos, vista como uma ferramenta de “assistência social na altura do desemprego”.
Em segundo lugar, Adolfo Mesquita Nunes refere a aposta na Investigação e Desenvolvimento, apontando para os níveis de Portugal, abaixo da OCDE, com o exemplo prático da Estónia: no início do século 21, o PIB do país era 40% inferior ao português, hoje é 7,5% superior.
Em Portugal, tradicionalmente, não se medem os resultados do investimento. “Não interessa gastar muito, interessa saber em que estamos a gastar. Gastamos pouco e gastamos mal”, afirma. Para além da necessidade de investimento, refere a importância de as empresas admitirem investigadores e colaborarem com Universidades e Centros de investigação.
Uma visão positiva sobre o futuro trabalho
Em conclusão, “não há dúvida de que o mundo é um lugar horroroso, mas o mundo foi sempre pior do que aquele em que vivemos hoje”, diz, acrescentando “estamos, apesar de tudo, num ponto melhor do que no tempo dos nossos avós”.
O ex-deputado que se assume um “adepto da automação”, usa ainda os argumentos de David Autor, professor e especialista em mercado laboral, que através do estudo de 28 indústrias, nos países da OCDE, conclui que desde 1970, a automação não contribuiu para o desemprego nunca. Pelo contrário, nas últimas 30 décadas reduziu o número de desemprego, criou emprego mais qualificado e bem pago e com melhores condições.
“Não nos podemos esquecer de algo que é sistematicamente esquecido. As novas tecnologias criam mais emprego do que destroem”
Os novos empregos criados pelas novas tecnologias “serão mais bem pagos e mais necessários”, além disso, ao transformar tarefas longas e pesadas, em leves e fáceis “podemos ter outras profissões e dedicarmo-nos a outras coisas”.
Sobre isso, fala do seu caso pessoal: “quando escolhi o curso de direito, não sonhava que podia ser outra coisa, hoje teria tirado outro curso. Adoraria ser guionista de humor”, partilha.