Nos últimos anos, organizações atravessaram desafios e repensaram modelos de trabalho, tendo oportunidade de ver sob uma nova perspetiva o que motiva os profissionais a querer ficar e crescer com a empresa. Num setor como o tecnológico, onde, de acordo com o estudo Talent Shortage 2023 do Manpower Group, 87% dos empregadores refere sentir escassez de talento, ouvir os colaboradores, o que valorizam e do que necessitam é um passo essencial para trabalhar na retenção e evolução dos seus especialistas.
Vivemos uma época de dicotomia e polarização que arrasta modelos de trabalho e de liderança num vortex por vezes confuso de compreender. Enquanto umas empresas promovem cada vez maior flexibilidade na gestão de horários, com a semana de quatro dias a encabeçar a mudança, outras optam por um regresso ao “velho normal”, num regime totalmente presencial. E não falamos dos “pequenos”, mas antes de nomes sonantes como Google, Amazon ou Zoom (curioso como a ferramenta de trabalho à distância fomenta o presencial, não é?).
No entanto, enquanto as organizações lutam para voltar ao que conheciam como “normalidade”, assistimos a um novo movimento de resistência por parte dos colaboradores, revelando como o regresso a modelos obsoletos não é mais um dado adquirido para as empresas – aliás, 87% dos profissionais refere mesmo que considera sair de uma empresa que não priorize o seu bem-estar, de acordo com um relatório da Gympass.
Coffee badging é a mais recente num rol de tendências que marcam esta relutância das pessoas ao regresso forçado ao escritório, mostrando, por um lado, como tantas organizações estão a resistir à mudança e, por outro, como os colaboradores não ficam mais de braços cruzados a assistir, impávidos e serenos, a essas decisões. Numa tradução literal, o “crachá do café” consiste em aparecer no escritório só e apenas para tomar café com os colegas, cumprindo a “quota” de tempo presencial a que os profissionais estão a ser forçados.
Mas terá sido esse tempo de qualidade? Será que se conseguiu reforçar o espírito de equipa e a identificação com a empresa? Ou terá sido exatamente o contrário, e cresce um mal-estar que se espalha rápida e silenciosamente? Salas para sesta, mesas de matraquilhos, lanche gratuito: por incrível que seja o escritório, há outras condições a atender e outros benefícios que os colaboradores valorizam.
Estar fisicamente num sítio não é sinónimo de proximidade, mas até de afastamento. É essencial, enquanto gestores e líderes, pararmos para pensar o que pretendemos, realmente, dos nossos modelos de trabalho, não esquecendo nunca que são as pessoas que fazem as organizações e os seus resultados.
A cultura organizacional constrói-se com feedback transversal, onde colaborador e organização crescem graças ao trabalho de ambos e à abertura para constante melhoria. Se os resultados são alcançados juntos, então é essencial garantir, em primeiro lugar, que estão reunidas as condições ótimas para a produtividade, envolvimento e felicidade dos colaboradores com a organização. Sem uma consideração real pelas suas necessidades, não podemos esperar dos colaboradores uma entrega igualmente real.
Com impacto na produtividade, ambiente de trabalho e resultados, há muito mais a perder do que a ganhar nestas decisões que tentam reverter um caminho já conquistado e valorizado pelos colaboradores, correndo o risco de, na teimosia do convencional, perder o talento de excelência e o comboio da inovação.