Não existe hoje em dia nenhum fórum ou comunidade empresarial que se atreva a descartar este tema. A guerra pelo talento ou a escassez de talento, expressões doravante usadas como sinónimos, constituem uma preocupação séria, um assunto dos nossos dias, para os quais as respostas são ainda frequentemente deficitárias.
Não estarei, aliás, a faltar à verdade se disser que a larga maioria dos nossos empresários e gestores defende a tese de que a escassez ou falta de talento é uma realidade incontornável, que por sua causa existem dificuldades operacionais graves em muitos setores da atividade económica, nomeadamente nos mais pujantes e dinâmicos, capazes de condicionar a realização de importantes investimentos em Portugal.
A este respeito será talvez bom recordar que a escassez de talento não é um assunto português, longe disso; não é também, apenas, um tema dos nossos dias, como se, de repente, de um fenómeno recente e inesperado se tratasse; e não é, seguramente, o principio do fim do crescimento económico, da atividade empresarial, da iniciativa privada.
A escassez do talento merece uma reflexão séria e ponderada, que não deve reconduzir-se à ideia ambivalente do verdadeiro ou falso, a favor ou contra, ser ou não ser.
A guerra pelo talento não pode, nem deve ser vista como uma ameaça. Pelo contrário, e sem pretender embarcar em exagerados otimismos, é como oportunidade que a temos de enfrentar, se queremos sair bem de mais este importante e ambicioso desafio.
E é talvez a propósito deste ponto que gostaria de trazer à colação uma ou duas ideias, porventura mais arrojadas, para além de muitas outras, mais debatidas, senão mesmo repetidas a este respeito, tanto pelos defensores, como pelos detratores do que aqui se discute.
O talento não se reconduz ou limita aos mais jovens, aos que têm mais escolaridade, aos que tiveram acesso às melhores universidades ou estabelecimentos de ensino superior.
O talento não se pode igualmente circunscrever às pessoas que, em cada momento, não fazem parte da minha empresa ou organização, que estão no mercado, são quadros ou gestores, que exercem a sua atividade nos meus concorrentes ou que têm desenvolvido a sua carreira profissional noutros setores da industria ou comércio ou em diferentes áreas funcionais.
O talento, nesta aceção, não são apenas os Recursos Humanos que não fazendo parte integrante da minha organização, cada empresário ou gestor gostaria de poder contar nas suas fileiras.
Há talento em todas e cada uma das organizações. Na sua, certamente. Talvez até, na sua, mais do que nas demais.
Agora, será que já se deu ao trabalho de pensar nisto? Quantas pessoas, na sua organização, podem fazer mais, ser mais produtivas e realizadoras?
Em cada pessoa há por certo um manancial de capacidade, génio e vontade por explorar e aproveitar.
Se não estivermos atentos, se não pusermos em funcionamento um conjunto de políticas, práticas e iniciativas, a boa gestão, no fundo, tal riqueza ou potencial, será eternamente um valor teórico, que corre o risco de nunca se vir a concretizar.
A boa liderança, na minha conceção e experiência, é capaz de criar as condições para que as pessoas deem o melhor de si mesmas, e mais ainda, possam ser felizes no trabalho.
Nestas empresas e organizações, em igualdade de circunstâncias, ou seja, mesmo enfrentando a questão da escassez ou guerra pelo talento, as alegadas consequências negativas que normalmente lhes são atribuíveis, sê-lo-ão em grau infinitamente inferior. E nisto já reside uma vantagem, mais não fosse.
Sofrem, pois, muito mais aqueles que não dedicam às suas pessoas, nas respetivas organizações, a atenção, o cuidado e o respeito que essas pessoas e recursos efetivamente merecem e reclamam.
Nesta visão das coisas, que é a minha, atrevo-me até a dizer que se houvesse melhor liderança e melhores políticas de gestão de pessoas nas empresas, muitos dos problemas e dificuldades existentes, como é o caso em apreciação, para os quais ainda não se encontraram as respostas mais pertinentes e acertadas, ou não existiriam ou teriam uma expressão manifestamente mais pequena, libertando energia positiva para outros rasgos e voos, de que Portugal tanto carece.
Por fim, e tal como atrás deixei expresso, a escassez ou guerra pelo talento não é uma realidade exclusiva dos mais jovens, ainda que muito do que hoje se discute tenha sobretudo a ver com capacidades e competências de gestão – técnicas e humanas –, qualidades muito caras a esses mesmos jovens, que devemos promover e apadrinhar.
Mas é preciso ver mais longe para se poder superar muitas das dificuldades e fragilidades que atualmente enfrentamos. Há muitas outras formas de trabalho e de organização dos meios que não podemos, nem devemos, descurar.
Refiro-me, por exemplo, ao facto de, para além da seleção e recrutamento de jovens promissores, de elevado potencial, muito merecedores das melhores oportunidades de trabalho e evolução de carreira, existirem outros mercados, pessoas e recursos disponíveis na economia e na sociedade, que podem dar um excelente contributo para a resolução/superação das presentes questões e dilemas, bastando apenas que da parte dos nossos empresários e gestores haja a criatividade e a coragem de não optar pelo caminho mais fácil e/ou mais óbvio, não necessariamente sempre o melhor.
E para não me alongar mais, deixo apenas uma pergunta, que é também um repto: por que é que muitos, diria, demasiados, dos nossos empresários e gestores, teimam em não aproveitar mais e melhor, quadros, técnicos e gestores, com conhecimentos e experiência muito relevantes, enorme capacidade de trabalho e organização, e bem, assim, dotados de indesmentível vigor físico e mental? Será apenas porque essas pessoas têm 50 ou mais anos de idade?
Por: Carlos Figueiredo, consultor / of counsel da PLMJ