Um evento recente na Católica Porto Business School (CPBS), em parceria com a Nova School of Business and Economics (Nova SBE), reuniu profissionais que, tendo experiência em gestão empresarial, concedem parte do seu tempo a apoiar organizações do setor social. Algumas pessoas integravam Conselhos Consultivos deste tipo de organizações. O encontro inseriu-se no âmbito do curso “Liderança social para gestores”, ministrado na Nova SBE e na CPBS.
A sessão, intitulada “Desafios da liderança em organizações sociais”, visou a partilha de experiências e a aprendizagem coletiva. Aquando da síntese das aprendizagens, uma participante expressou o seguinte comentário: “Futuramente, não deveria ser necessário incorporar a palavra ‘sociais’ no título da sessão”. Na sua perspetiva, os desafios da liderança são desafios …nas organizações. Ponto! O comentário encerra uma aprendizagem fundamental: as lideranças das organizações sociais têm muito a aprender com profissionais de gestão e liderança das empresas – mas estes também têm muito a aprender com aquelas. Como explicar esta jornada de aprendizagem mútua?
Segundo a ideia prevalecente, as organizações sociais poderão ser geridas de modo mais sustentável se as respetivas lideranças aprenderem com as experiências de gestão e liderança das empresas. A premissa subjacente é a de que muitas lideranças das organizações sociais carecem de competências de gestão e liderança. Essas lideranças, presume-se, orientam-se por um valioso sentido de missão, atuam generosamente, e “fazem o melhor que podem”. Mas o défice de competências de gestão dificulta-lhes a captação e a gestão eficaz de recursos humanos, materiais e financeiros. Algumas lideranças de organizações sociais entendem que práticas empresariais como a venda de produtos e a prestação de serviços turvam a nobreza da missão social. Em suma: prevalece a noção de que, na gestão e liderança das organizações sociais, sobressai a dimensão “social” e está ofuscada a dimensão “gestão”.
Esta interpretação corresponde à realidade de muitas organizações sociais. Consequentemente, a insuficiência de competências de gestão e liderança reduz significativamente a capacidade dessas organizações de prosseguirem a missão social, com prejuízo para os beneficiários da mesma. Todavia, essa descrição é incompleta. Também as lideranças das empresas podem aprender com as experiências de liderança em organizações sociais. Peter Drucker escreveu-o há décadas. As lideranças de empresas perdem de vista, por vezes, quem servem – algo que as organizações sociais não podem fazer, sob pena de fenecerem. Esse é, pois, um espaço de aprendizagem para as empresas. Há também experiências “marcantes” que permitem aos líderes empresariais saírem da sua “bolha” e darem-se conta das realidades adversas experienciadas por franjas desfavorecidas da sociedade ou cujas vidas são dominadas pela adversidade. Daqui resultam vantagens:
- A compreensão dessas realidades pode ajudar esses gestores a desenvolverem mais empatia para com trabalhadores que, mal remunerados e desconsiderados, vivem um quotidiano pessoal e familiar problemático.
- Essa empatia encoraja-lhes o sentido de justiça. Fá-los “descer à terra”. Torna-os mais capazes de reconhecerem os contributos dos colaboradores, incluindo os que ocupam funções mais modestas ou penosas. Capacita-os para promoverem culturas empresariais mais inclusivas e cooperativas, e psicologicamente mais seguras.
- A experiência em organizações sociais também permite a esses gestores consciencializarem-se da necessidade de as suas empresas se preocuparem, realmente e não apenas nas narrativas, com responsabilidades sociais.
- Quando lidam com membros da sociedade com vidas adversas, esses gestores também podem desenvolver competências transculturais que lhes permitem ser melhores líderes quando realizam missões internacionais em países cujas culturas são diferentes da do seu próprio país.
- Ao observarem o esforço abnegado de líderes e profissionais de organizações sociais, por vezes em regime de voluntariado ou com salários modestos, estes gestores podem também desenvolver humildade e maior respeito pelos outros. O risco de desenvolverem a soberba e viverem “acima das nuvens” é menor.
Encarar os dois tipos de organizações como mundos separados pode não ser, portanto, a melhor forma de promover o desenvolvimento económico-social de uma sociedade. A investigação e a experiência ensinam-nos que os dois mundos podem e devem dialogar mais – e que a participante no nosso evento fez uma observação certeira. Desejavelmente, liderança só há uma: a das equipas e organizações.
Com a coautoria de Raquel Campos Franco, LEAD.Lab, Católica Porto Business School