Pedro Dionísio é Diretor da Pós-Graduação em Gestão e Marketing do Desporto do ISCTE Executive Education. O desporto é, na sua génese, uma área que desperta paixões. Falar em marketing desportivo é analisar de que forma as marcas utilizam o desporto para comunicar os seus produtos junto dos consumidores e com isso criar laços duradouros. Em entrevista à Líder, Pedro Dionísio falou sobre a importância da estratégia e o poder do desporto, que move multidões muito para além do futebol.
Em que medida o Marketing desportivo é diferente das outras vertentes do Marketing?
Eu sou um grande apaixonado pelo desporto. O desporto é uma área muito especial, pois envolve, acima de tudo, muita emoção. Dito isto, é importante olhar para esta área de forma um pouco diferente, em relação às outras, embora tenha, evidentemente, pontos em comum. O maior objetivo de um gestor de marketing no desporto é criar a maior interação possível entre o consumidor e a marca, quer seja um clube, uma associação, um evento ou uma marca comercial. Para isso, como em tudo no marketing, é imprescindível ter o consumidor como foco principal em tudo o que se faz. Para chegar aos públicos-alvo, os meios digitais estão a ganhar importância, mas o marketing desportivo tem uma maior facilidade do que outras áreas em conseguir gerar experiências memoráveis – algo que é muito importante para a fidelização.
Quais as diferenças entre esta geração e a sua antecessora no que toca a valores e na forma como olham para o desporto e o promovem?
Ao longo das últimas décadas, tem existido um aumento significativo do conhecimento na área do marketing desportivo. Isto faz com que as novas gerações tenham ferramentas de trabalho que as mais antigas não tiveram. Para além disso, nos dias que correm também existe uma maior consciência geral relativa aos valores da sociedade em que nos inserimos, como a sustentabilidade, a saúde e a vida ativa, que acaba por trespassar para o desporto.
Num mundo atual onde se tem vindo a consciencializar sobre temas como a igualdade de género, diversidade, fair play, empatia e outras questões sociais, éticas e ambientais, como tem o desporto contribuído para essa divulgação e consciencialização?
O desporto e as instituições desportivas têm um papel muito importante na vida de milhões de pessoas, em todo o planeta. Por essa razão, tem também muito poder. E com o poder vem a responsabilidade. Cabe às instituições desportivas, nomeadamente aos seus gestores de marketing, utilizar o seu grande alcance para promover e espalhar a consciencialização relativamente aos mais diversos temas da sociedade. Temos o caso, na Premier League, relacionado com o movimento “Black Lives Matter”, em que os jogadores das 3 equipas se ajoelham, antes do jogo começar, simbolizando o apelo ao fim do racismo e à igualdade racial. A guerra da Ucrânia também nos trouxe exemplos, com os apelos à paz por parte de atletas, como foi o caso do Roman Yaremchuk, Ucraniano e jogador do Benfica.
Este tipo de ações, não só ajuda a consciencializar e a melhorar o mundo, como acaba por trazer, mesmo que a longo prazo, dividendos para as diversas instituições desportivas que as praticam.
Os portugueses estão mais conectados ao futebol do que a outras modalidades. Porquê?
O futebol é o desporto mais comercial do mundo, e o mais visto na maioria dos países a nível mundial. Nesse sentido, não é de estranhar que os portugueses estejam mais conectados ao futebol do que a outras modalidades. No entanto, é tarefa do Marketing Desportivo despoletar a atenção e o interesse para as modalidades com menos visibilidade. Muitas vezes, as pessoas apenas não assistem a outras modalidades desportivas por uma questão de desconhecimento ou inércia, e não por não gostarem.
Que mudanças houve na valorização de modalidades desportivas menos reconhecidas ou menos aderidas em Portugal?
Apesar da Constituição da República colocar no Estado a obrigação de promover o desporto, os valores monetários que são atribuídos às Federações provêm exclusivamente das apostas, e limita-se a pouco mais de 5€, por mês, por atleta, quando dividido o valor total atribuído ao desporto pelo número total de atletas. Neste contexto, não é fácil a missão das Federações.
Muitas modalidades possuem excelentes atletas que não são reconhecidos ou não têm acesso às melhores condições de treino ou equipamentos. Quais são as principais carências?
Relativamente ao reconhecimento, creio que se deve ao marketing pouco desenvolvido pelas instituições desportivas, e à falta de estratégia dos dirigentes, apesar de, como referi a cima, os budgets não ajudarem. No que toca à falta de condições, penso que é preciso, essencialmente, que uma escolha seja feita e um passo claro seja dado pelo Estado no sentido de ter ou não como objetivo a prática generalizada e a competitividade desportiva. Por muito bons que sejam os gestores, se não existirem fundos para dar as condições adequadas aos atletas, estes nunca poderão atingir o seu potencial máximo. Como em tudo na vida, é necessário ter uma estratégia a longo prazo e os meios necessários para concretizá-la.
Como podem as lideranças fomentar a prática do desporto e alavancar as modalidades em Portugal?
Considero que o desenvolvimento do desporto deverá passar, entre outros, pelos seguintes pilares de intervenção:
– Articulação entre desporto escolar e federado;
– Estruturação da oferta desportiva por concelho, de acordo com as faixas etárias, para permitir a sua prática ao longo de toda a vida;
– Campanhas de comunicação nacionais acerca dos benefícios da atividade desportiva para a saúde, física e psicológica, e para a socialização dos cidadãos;
– Informação digital atualizada entre mercado de oferta e procura da prática de modalidades e de espetáculos desportivos, por Concelho;
– Federações a trabalhar com base em orçamentos aprovados previamente pelo Instituto Português do Desporto e Juventude no ano anterior – e não em meados do próprio ano, como acontece atualmente, por estarem dependentes das projeções de verbas das apostas, que só acontecem em Março/Abril.