A cantora e compositora de origem cabo-verdiana nasceu em Cuba em 1985, viveu uma infância em constante errância fruto da atividade diplomática do pai e em 2003 fixou-se em Paris.
Mayra Andrade há um par de anos trocou Paris por Lisboa e tem escolhido cantar em português e crioulo de Cabo Verde, deixando de lado a expressão musical em francês ou inglês.
Tem-se mantido ligada às suas raízes. A celebração acontece em palco, mercê de uma dinâmica desenhada ao milímetro com a cor dos ritmos quentes africanos.
Mayra é a personalidade escolhida para a rubrica “Líder em Destaque” na edição da Líder Cabo Verde 2024.
É uma das referências cabo-verdianas no Mundo. O que tem em si de Cabo Verde?
A identidade, as experiências de vida, a ligação pessoal e artística com o país e o povo das ilhas.
Como definiria a matriz identitária cabo-verdiana?
A matriz resulta da intersecção de elementos culturais, históricos, sociais e geográficos que definem a identidade única e multifacetada dos cabo-verdianos. Esta identidade é profundamente influenciada pela sua história de colonização, pela mistura de culturas africanas e europeias, pela nossa diáspora e insularidade.
O Escritor Mário Lúcio afirma que “somos todos crioulos, porque na verdade, antropologicamente, está provado que temos raízes múltiplas desde há milhares de anos”. Cabo Verde afirma uma singularidade da sua sociedade crioula. Os crioulos pertencem ao Atlântico. O Atlântico moldou esta terceira nova identidade?
O Atlântico, enquanto espaço de ligação e de trocas transatlânticas entre África, Europa e América, desempenhou um papel fundamental na formação desta identidade crioula, onde diferentes culturas se encontraram, se misturaram e deram origem a algo novo.
Muitos cabo-verdianos não se sentem africanos ou europeus, mas sim atlânticos. Considera que existe uma liderança atlântica?
Sinto-me africana e hoje não considero que haja uma liderança atlântica. No entanto, pode ser interpretada de várias maneiras, nomeadamente na promoção de valores como a inclusão, a diversidade e o respeito mútuo entre os povos do Atlântico, reconhecendo e valorizando as diferentes identidades e experiências que compõem a região como um todo. Isto pode passar por parcerias económicas, culturais e educativas que tirem partido das afinidades históricas e culturais partilhadas entre estas nações.
Cabo Verde tem uma população de 500 mil residentes e estima-se que a diáspora seja de 1,5 milhões de cabo-verdianos e descendentes. Há uma parte constitutiva da nação que está além-fronteiras. Como é que gostaria de ver Cabo Verde daqui a cinco anos?
Como um país que continua a crescer e a desenvolver-se. Um país que investe em projetos e políticas que promovem o desenvolvimento sustentável, a inclusão e a coesão social, a inovação e a valorização da sua cultura dentro e fora das fronteiras, apoiado por uma governação eficiente, transparente e responsável.
Deixe-nos uma ideia para melhorar o país?
Apesar dos progressos registados, existem ainda muitos desafios, o que significa que só uma abordagem holística e integrada poderá catalisar uma transformação positiva em Cabo Verde. É necessário agir no sentido de uma maior diversificação económica, conectividade, educação de qualidade, inovação, proteção ambiental, entre outros.
Se tivesse de deixar algumas palavras aos líderes cabo-verdianos, o que é que lhes diria?
Apelaria aos líderes cabo-verdianos para ouvirem atentamente as vozes e preocupações da população, para terem sempre presente o compromisso que assumiram com o povo deste incrível país e, enquanto funcionários públicos, honrarem a responsabilidade de trabalhar em benefício do povo cabo-verdiano com visão. É fundamental que cada cabo-verdiano tenha a oportunidade de atingir o seu pleno potencial.
E para os jovens?
A minha mensagem é que sejam cada vez mais determinados e ousados na busca dos seus sonhos e aspirações, que invistam na educação, que sejam agentes de mudança positiva na nossa sociedade. É preciso energia e paixão para resolver os problemas que enfrentamos como nação.
Quem são as suas grandes referências?
Na música/cultura nunca consegui responder calmamente a esta pergunta porque há seres excecionais em todas as culturas que me tocam e influenciam.
Na luta pelos direitos civis: homens e mulheres de todo o Mundo, anónimos, que em várias frentes são o retrato da luta incessante pela paz, pela dignidade humana e por este Planeta que é a casa de todos os seres vivos.
Curiosidades sobre Mayra Andrade:
Educação académica: 12.º ano e uma curta passagem pela faculdade, em França, onde estudei Arte e Comunicação, antes de decidir que tinha de me dedicar a 100% à carreira que já tinha iniciado.
O que faz quando tem tempo livre: Tomo conta do meu bebé, estou com amigos, cozinho, viajo, vejo um bom documentário.
Livros da sua vida: O dicionário
Podcasts: Raramente oiço
Viagens de sonho: Gostava de conhecer melhor o continente africano
Líder que a inspira: Amílcar Cabral
Este artigo foi publicado na edição da Líder Cabo Verde 2024. Subscreva a Líder aqui.