Viktoria Kaufmann-Rieger é diretora-geral da SIVA, Sociedade de Importação de Veículos Automóveis, uma empresa com cerca 300 trabalhadores que representa todas as marcas do grupo Volkswagen no mercado português. Apaixonada por liderar e inspirar pessoas, é focada no seu percurso profissional, onde encontra a força e a motivação para os desafios. Entre as suas figuras de referência, conta com a sua avó e o Jeff Bezos, CEO da Amazon.
Em conversa com a Líder, ficamos a conhecer esta mulher, líder num mundo de homens, para quem o setor automóvel representa grandes oportunidades para as mulheres. E explica que, afinal, existe sim, uma forma de liderar que é sobretudo mais evidente nas mulheres. Haja menos timidez de ter ambição ao sucesso.
A sua carreira iniciou-se como estagiária na Porsche Aústria. Hoje é Diretora geral da SIVA|PHS em Portugal. Como descreve o seu percurso profissional?
Tenho tido a sorte de ter um percurso muito rico, onde as oportunidades se foram apresentando e que só se tornaram possíveis graças ao enorme apoio familiar que tenho e que sem o qual não estaria onde estou. Sempre fui muito focada e com objetivos bem definidos. No primeiro dia do meu estágio sabia que queria ser diretora-geral e que queria ser administradora de uma empresa. Gosto muito de dar impacto ao negócio, de trabalhar com muitas pessoas, com grandes talentos e produtos.
Dentro do Porsche Holding tenho a oportunidade de conhecer outros países, novas culturas e pessoas. E no fundo, o meu percurso profissional acabou por fazer esse trajeto, porque esta empresa proporciona esse caminho. Deixei o meu país em 2012 para assumir o cargo de gestora de projeto para a aquisição do nosso importador recentemente integrado Porsche Chile, em 2016 mudei-me para a Porsche Colômbia, como Managing Diretor do importador das marcas VW, Audi, SEAT, Skoda e em 2019 venho para Portugal, onde me foi dada a oportunidade de Managing director e administradora da SIVA|PHS, na qual me encontro até hoje. Tem sido muito gratificante, mas também desafiador, mas acredito que é nos desafios que surgem as melhores oportunidades.
Quais foram os pontos marcantes?
Foram vários os momentos, mas sem dúvida que aquele que destaco como mais desafiante foi a pandemia em 2020. Tinha chegado a Portugal em outubro de 2019 com um plano muito claro e menos de 6 meses depois, instala-se uma pandemia que nos trouxe vários desafios adicionais, mas que por outro lado, nos deu a oportunidade de transformar profundamente a SIVA|PHS. Com a pandemia deparámo-nos com uma situação para a qual ninguém estava preparado: não existiam processos definidos pelos HQ, tivemos de nos adaptar a um formato de teletrabalho e trabalho híbrido ao mesmo tempo. A gestão de equipas à distância, e estamos a falar de uma empresa com 300 pessoas, e o meu português ainda não era o melhor, pelo que foi um enorme desafio para todos, que superámos de forma unida.
Quem a inspira e quais são os seus líderes de referência?
Encontro inspiração em fontes diversas que têm influenciado significativamente o meu espírito empreendedor. Primeiro, a minha avó tem sido uma constante fonte de inspiração. A sua determinação inabalável, a amabilidade e a forte ética de trabalho, incutiram em mim os valores da perseverança, resiliência e do poder de uma atitude positiva. Estas qualidades têm-se revelado inestimáveis tanto em iniciativas pessoais como em empreendimentos profissionais. Também os meus pais, especialmente através do nosso negócio de família, desempenharam um papel vital na formação do meu impulso empreendedor.
Adicionalmente, na minha admiração por líderes exemplares, Luise Piech destaca-se como uma figura com notáveis competências de liderança, ao fomentar a colaboração e a motivação enquanto impulsiona o crescimento organizacional. Também Hildegard Wortmann, uma líder visionária na indústria automobilística, tornou-se um modelo a seguir pela sua notável visão estratégica. Além disso, admiro líderes que priorizam uma mentalidade de crescimento, promovem a criatividade e capacitam as suas equipas. Jeff Bezos, o fundador da Amazon, personifica esta abordagem. A sua filosofia centrada no cliente, aliada à disposição para correr riscos calculados, transformou o comércio eletrónico e a computação em nuvem.
Quais são para si os traços inerentes a um líder positivo e inspirador?
Comecei a liderar equipas aos 27 anos e para superar os vários desafios é preciso comunicação e saber ouvir as pessoas. Este é um tema muito importante a nível pessoal, de liderança e de negócios. Um líder tem de saber antecipar necessidades, ser positivo e inspirador, obviamente, mas um dos traços que considero mais importante é o de conseguir motivar as pessoas e saber conduzi-las para o sucesso. Inspirar os outros e ajudá-los a crescer, fazê-los acreditar no seu potencial, no valor que aportam às empresas, às equipas e ao todo, incrementando e desenvolvendo a sua autoestima e empoderamento pessoal. Outros traços que considero importantes são a inteligência emocional, ter uma ambição e objetivos claros, com perseverança e capacidade de trabalho. Ser digno de confiança e manter-se fiel a si próprio.
O setor automóvel está em profunda transformação. Atualmente, os automóveis são responsáveis por quase um terço das emissões de CO2 e a era da combustão tem um fim anunciado. Que desafios e oportunidades se avizinham?
Um dos maiores desafios que temos relacionados com este tema, e que se prendem diretamente com o nosso país, é a antiguidade do parque automóvel em Portugal, onde os carros têm uma média de 13 anos. São altamente poluentes e somos, também, um dos países da Europa com o parque automóvel mais antigo – o que significa um trabalho acrescido em termos de redução de pegada carbónica e de mudança de mentalidade e educação do consumidor, assim como, de segurança.
É muito importante o apoio do Governo, com incentivos ao setor, como por exemplo o apoio ao abate, essenciais para a troca de viaturas e consequente redução de emissões. Por outro lado, há a oportunidade de contribuir de uma forma transparente e honesta para a mudança, promovendo mais práticas sustentáveis e a contribuição para um mundo, efetivamente, melhor. Na SIVA|PHS comprometemo-nos a cumprir os objetivos do Acordo de Paris e do Acordo Verde Europeu da UE. O objetivo a longo prazo é tornarmo-nos completamente neutros em termos de carbono até 2050.
O que se pode esperar relativamente ao mercado português?
Trabalhamos fortemente com as nossas marcas Volkswagen, Audi, SEAT, Skoda, Volkswagen Veículos Comerciais, CUPRA, Bentley e Lamborghini de forma a contribuir para uma sólida performance e presença no mercado. Aumentámos a visibilidade das nossas grandes marcas no mercado português e isso permitiu reforçar a confiança que os nossos parceiros e clientes depositam em nós. Gosto muito de Portugal e um dos meus atuais desafios é continuar a fazer com que a empresa e as marcas cresçam e ocupem o lugar onde merecem estar, sabendo que a conjuntura nacional e internacional atual é extremamente desafiante.
É inevitável associar a sua liderança, enquanto mulher, a ser feita num mundo de homens. Dados mostram, e várias análises corroboram, que as empresas geridas por mulheres têm melhores performances. Como tem sido a sua experiência?
Apenas posso falar por mim e nesse sentido, considero que a minha experiência tem sido muito positiva. O setor automóvel, apesar de ser um setor dominado ainda pelos homens, é de um enorme potencial para as mulheres, permitindo-nos adquirir ferramentas, seja em liderança, como na gestão, que nos enriquecem, além de nos tornar, no todo, mais completas. Acredito que o setor automóvel necessita de mais mulheres em cargos de topo e de liderança, mulheres poderosas, que gostam de desafios e que não têm medo de aprender, de identificar oportunidades e de mostrar as suas competências e mais valias para este setor. Temos produtos atrativos e a oportunidade de fazer parte de uma grande transformação do setor, onde a forma de trabalhar e a evolução é continua. Penso que isso, por si só, é um enorme aliciante para as mulheres.
Qual o posicionamento da SIVA no que respeita a cultura de Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI)?
A SIVA|PHS está num momento em que as questões de diversidade, equidade e inclusão já fazem parte do ADN e valores da empresa e estão presentes na forma como definimos a nossa estratégia e como projetamos o futuro. Não se trata apenas de ter só um determinado número de homens e mulheres na companhia, ou uma quota de género como KPI, mas sim o de ter equipas cada vez mais diversificadas, com diferentes visões e culturas, porque quanto mais diversa for uma equipa, melhores vão ser os seus resultados.
Desenvolvemos um grande trabalho em conjunto com o nosso HQ: manter, ajustar, mas também trazer inovação, talento, novas perspetivas que consolidem a nossa aposta numa empresa mais moderna, capaz de responder aos desafios do setor, antecipando também tendências, criando valor. Apostamos nas pessoas, no talento e queremos ser uma empresa atrativa. Dessa forma, queremos continuar a trazer novo talento para a empresa, trazer mais pessoas e tentar misturar novos talentos com pessoas que estão há mais tempo na empresa – porque só assim melhoramos a nossa performance. Os novos talentos trazem uma visão completamente nova, que nada tem a ver com aquilo que estamos habituados a fazer, têm uma visão mais clean. Equilibrar isto com uma visão mais madura, é algo muito importante.
Valorização do equilíbrio entre vida pessoal e profissional, empatia, capacidade de comunicação, estão são algumas das características associadas a uma liderança no feminino. Qual a sua opinião sobre um “tipo de liderança” feita pelas mulheres? É mesmo diferente?
Uma das lições que retirámos dos primeiros momentos da pandemia, que foi um momento muito desafiante para todos e que colocou muita pressão nas chefias e nos líderes, é que as pessoas precisam de saber que quem está na gestão sabe o que se passa e que tem um plano para gerar confiança. E considero que as mulheres são muito hábeis nessa tarefa de ir ajustando as necessidades e de ‘sentir os outros’, equilibrando tudo o resto em função disso. Não devemos ter medo de errar, devemos pensar fora da caixa e ter uma atitude positiva em relação à mudança. É essencial, mesmo com a mudança de planos, ter uma visão de longo prazo e todos devem conhecê-la. Um líder deve dar responsabilidade pelos resultados às pessoas, dar-lhes recursos e autonomia para gerar envolvimento e ajudá-los a conseguir os objetivos.
As mulheres são mais corajosas, têm menos medo de falhar. Concorda?
Penso que as mulheres ainda têm uma certa timidez no que diz respeito a assumirem a sua ambição ao sucesso – seja pessoal, como profissional. Somos seres dotados de múltiplos talentos e multifuncionalidades que nos enriquecem e que nos tornam robustas na forma como fazemos as coisas e nos entregamos aos projetos. Também temos medo de falhar, mas enfrentamo-lo, no fundo, sim, somos corajosas, mas com um enorme poder de adaptação – no sentido em que mesmo com medo, avançamos – mas temos presente os riscos que comporta e o que está em jogo. Isto é algo em que temos de trabalhar ainda mais – para que todos, especialmente as mulheres, possam deixar a timidez e apresentarem-se orgulhosamente com os resultados que geram.
Quais as suas expetativas para 2024?
A nível profissional diria, sem dúvida, contribuir para continuar a preparar a SIVA | PHS para a transformação do sector e fazer crescer a empresa e as marcas que a mesma representa, numa posição de liderança. A nível pessoal, ter a minha família e núcleo duro próxima de mim, com saúde e unida e que o mundo acalme um bocadinho, com menos guerras e conflito, mais focado na união, na paz e no amor.