O avanço da idade envelhece o corpo e a mente, mas ser “velho” dá, afinal, vantagem em algumas capacidades do cérebro que melhoram devido à experiência de toda uma vida. A conclusão consta de um estudo internacional da Faculdade de Letras de Lisboa, liderado pelo investigador português, João Veríssimo (Centro de Linguística da Universidade de Lisboa), em parceria com a Universidade de Georgetown, nos EUA .
O estudo publicado na revista Nature Human Behaviour, mostra que os mais velhos são mais aptos a prestar atenção ao que é novo e a focarem-se no importante e que dar atenção a novas informações e manter a concentração no que é relevante perante múltiplos estímulos são capacidades mentais que melhoram com a velhice.
A investigação “Evidence that ageing yields improvements as well as declines across attention and executive functions”, recaiu sobre 702 participantes, dos 58 aos 98 anos – uma amostra relativamente grande para este tipo de trabalhos e bastante maior do que amostras de estudos anteriores – e as vantagens cerebrais foram identificadas, sobretudo, até aos 76 a 78 anos. “Verificámos que os mais velhos obtiveram melhores resultados em dirigir a atenção e na capacidade de foco na informação relevante, inibindo o que distrai, e perderam para os menos velhos na função de alerta e vigilância”, explica João Veríssimo.
Para o professor da faculdade de Letras de Lisboa “Estes resultados não encaixam na ‘visão predominante’ de que o envelhecimento necessariamente significa declínios. Mas o estudo não revela só a ausência de declínios, revela também a existência de melhorias”.
Segundo os autores, as capacidades de atenção melhoradas com a idade são básicas, isto é, estão presentes na memória, tomada de decisão, autocontrolo, aptidões matemáticas, de linguagem ou de leitura e até no comportamento, podendo atuar como um escudo contra o declínio cerebral.
Por outras palavras, o envelhecimento do cérebro é inevitável com o passar dos anos mas não é generalizado e pode ser mitigado com o treino de aspetos básicos da cognição. A explicação reside num duelo: “Pensamos que há uma combinação de duas forças: o declínio e uma espécie de reserva cognitiva acumulada pela experiência, que, ainda assim, a partir dos 78 anos já não chega para garantir um benefício e a vantagem atenua-se e surge já algum declínio mental.”
O investigador português, sublinha que os ganhos na atenção e nas funções executivas agora descritos vêm na mesma linha de outras vantagens associadas à idade, por exemplo no vocabulário. Mas falta um link: saber como as diferentes funções do cérebro se interligam e como a atenção e as funções executivas, básicas, entram nas demais competências cerebrais e comportamentais. Sobre um coisa os autores têm uma forte suspeita: “Há qualquer coisa nessas funções básicas que é suscetível de treino”. Acreditam que “maior escolaridade dá resistência contra a doença de Alzheimer e pessoas que falam mais do que um idioma ou tocam um instrumento têm melhores resultados nas funções executivas”. Apesar do muito que está ainda por confirmar, para os investigadores há algo que parece certo. Treinar capacidades mentais, mesmo que básicas pode fazer a diferença.