Mais de metade dos líderes empresariais em Portugal permanece invisível no espaço digital. O alerta vem do CEO Monitor Portugal 2025, um estudo da consultora LLYC, que analisou a presença de 68 líderes das maiores empresas nacionais não financeiras. O diagnóstico é claro: há perfis bem arrumados, mas pouca voz; há LinkedIns otimizados, mas quase nenhuma interação. No país que se quer inovador, a liderança digital ainda caminha como quem carrega séculos às costas — pesada de tradição, lenta na coragem de se mostrar.
Poucos líderes têm ‘impacto digital’
O relatório revela que apenas 16 dos 68 CEOs avaliados atingem o nível considerado de ‘impacto digital’. Isto é: publicam regularmente, têm rede ativa e um discurso coerente com a identidade da empresa. A maioria limita-se à presença formal — um perfil corporativo, fotografia profissional e resumo biográfico — mas sem qualquer estratégia de comunicação.
A média nacional é desequilibrada: Portugal pontua alto em ‘otimização’ (quase todos os líderes têm perfis completos), mas baixo em atividade e influência. Como refere o estudo, «a presença digital em Portugal tende a ser estática, institucional e sem narrativa pessoal», o que diminui o alcance e a relevância da comunicação de liderança.
Os líderes que dão a cara
No topo da lista, Javier González Pareja, presidente da Bosch Group Espanha e Portugal, lidera o ranking com 85 pontos. Publica em duas línguas, mistura informação empresarial com reflexões sobre sustentabilidade e inovação, e mantém uma cadência regular. Segue-se Sofia Tenreiro, CEO da Siemens Portugal, com 81 pontos, destacando-se pela clareza e constância das mensagens. O pódio fecha com António Pires de Lima, da Brisa, com 70 pontos, cuja comunicação é centrada em mobilidade e estratégia empresarial.
Entre os dez primeiros figuram ainda Thomas Besson (Volkswagen Autoeuropa), Ana Figueiredo (Altice), Henrique Mota Mota (Samsung), João Bento (CTT) e Filipa Appleton (Auchan). O estudo evidencia que o setor industrial e tecnológico lidera a maturidade digital, enquanto energia, retalho e transportes ainda enfrentam resistência à exposição pública.
O medo de errar e o peso da cultura corporativa
A LLYC não se limita a medir métricas. O relatório procura compreender porque é que tantos líderes continuam afastados da esfera digital. A resposta, em grande parte, é cultural. Portugal ainda é um país de lideranças discretas, onde a comunicação externa é vista com desconfiança. Muitos executivos temem o erro, o julgamento ou a polémica — esquecendo que o silêncio também comunica.
Em contraste, noutros mercados europeus, os CEOs tornaram-se vozes públicas com impacto social. Em Espanha, por exemplo, o relatório mostra que 68% dos líderes empresariais comunicam ativamente, e na América Latina essa percentagem ultrapassa os 70%.
Em Portugal, o número é menos de 25%. O resultado é um défice de influência, tanto para as marcas como para os próprios líderes. Como refere a LLYC, «a ausência digital pode ser lida como distanciamento, e o distanciamento como falta de liderança».
De gestores a comunicadores
O relatório identifica uma mudança de paradigma: já não basta gerir negócios. É preciso começar a liderar conversas. Os CEOs de maior impacto são os que se tornaram narradores: contam o propósito da empresa, partilham bastidores, reconhecem desafios e falam com autenticidade. A chamada Social Leadership — liderança social — é hoje parte integrante do posicionamento de uma marca.
A LLYC sublinha que «a nova liderança digital não se constrói com estética, mas com presença, coerência e empatia». As publicações com melhor desempenho são as que têm voz pessoal e tom humano, onde o líder se mostra vulnerável, fala de equipas, de valores e até de fracassos. A análise é contundente: «O que distingue um perfil de impacto de um perfil apenas bem estruturado é a capacidade de combinar informação otimizada com atividade constante e diferenciadora.»
Dez mandamentos da liderança digital
No final, o estudo sintetiza o novo código da presença digital em dez princípios — um verdadeiro manual de sobrevivência para líderes que ainda hesitam:
Liderar com autenticidade — mostrar-se como pessoa, não apenas como cargo.
Ser vulnerável — reconhecer falhas e aprendizagens.
Manter coerência entre discurso e ação.
Humanizar a comunicação.
Apostar em formatos próximos — vídeo, áudio, texto pessoal.
Ser constante, não perfeito.
Construir comunidade, não audiência.
Gerar diálogo, não monólogo.
Partilhar conhecimento, não apenas resultados.
Defender causas, não só marcas.
São mandamentos simples, mas exigentes. E o relatório é claro: quem não fala, deixa de contar.
O poder e o risco de estar presente
Há um dado curioso no relatório: os líderes mais influentes digitalmente são também os que apresentam maior grau de confiança interna nas suas empresas. A comunicação autêntica reforça o compromisso dos colaboradores e atrai talento. Mas o inverso também é verdadeiro: o silêncio dos líderes amplia a distância com as equipas e com a sociedade.
Num tempo em que a reputação é frágil e o escrutínio é permanente, a ausência digital é uma forma de desistência simbólica.
Os CEOs portugueses, diz a LLYC, enfrentam agora a necessidade de aprender a expor-se com inteligência, e de compreender que o impacto público já não é opcional. O poder mudou de lugar: está em quem fala, não em quem se esconde.



