«Em Portugal, olhamos para o diploma universitário como o brevet de um aviador. É muito difícil condicionar a universidade para preparar os seus alunos para fins específicos na economia genérica. A economia é mutável, é crescente. Hoje o que interessa é que alguém seja preparado com uma série de exposições e de capacidades que lhe permitam fazer diversas coisas».
Foi com estas palavras que António M. Feijó, Professor da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, marcou o evento Challenging the Future que se debruçou sobre os novos desafios da educação.
O encontro, uma iniciativa do BNP Paribas Portugal, aconteceu no passado dia 15 de novembro em Lisboa e juntou várias vozes em torno da discussão “A educação hoje: novas Fronteiras”.
A conversa moderada pelo jornalista João Miguel Tavares juntou a António M. Feijó, Clara Palma (Vice-Presidente da Política Educativa Associação Académica da Universidade de Lisboa), Miguel Herdade (Associate Director do Ambition Institute), e Susana Peralta (Professora de Economia na Nova SBE).
Escolas, Tecnologia e Família
No contexto do tema, o painel centrou-se na discussão do papel das escolas perante a importância da tecnologia na vida das crianças e jovens, nos desafios da Inteligência Artificial (IA), na relação entre os curricula e as necessidades das empresas, bem como no papel e importância da família.
Miguel Herdade usa a sua experiência internacional na área da educação para analisar o ensino português. «Temos um sistema de ensino que alimenta as necessidades técnicas do mercado de trabalho e isso é limitativo, porque o papel das universidades não é só formar para o mercado», refere e reforça ainda: «Faz falta ver a universidade como um sítio que expande as fronteiras do cérebro humano e que enriquece os conhecimentos de cada um».
«A faculdade serviu para me ensinar a pensar», partilha, pelo que acredita que neste momento atual de desafios motivados pelas novas tecnologias, «vão fazer-nos voltar lá atrás e regressar ao teatro, aos clássicos, às artes».
«O que temos agora é uma grande oportunidade de olhar e resolver os problemas da nossa educação. Sou um grande otimista nesta matéria. Não é por haver um ChatGPT que vou deixar de pensar, porque para usar estas ferramentas tenho de saber o que lhes vou pedir ou perguntar», afirma.
E deixa o alerta: «O problema que temos em Portugal é a pobreza das crianças nas escolas, o cenário de termos uma próxima década sem professores».
Sobre o papel da Tecnologia, partilha a sua visão de que pode ser usada «para personalizar a educação, libertar recursos e criar modelos em que uma criança pode dirigir-se ao seu aparelho e ter as respostas de que necessita, em vez de esperar para estar de novo na sala de aula para tirar dúvidas», conclui.
Para Susana Peralta, «é absurdo o medo que temos destes aparelhos e destas ferramentas», confidencia. E ainda acrescenta, sob o seu ponto de vista enquanto Professora: «Não tenho a veleidade de querer obrigar que alunos – e mesmo os meus filhos – fiquem afastados daquela que é a realidade deles, que recorre ao uso destas ferramentas. Cabe-nos ensiná-los a lidar com elas. Sou a favor de ensinar a autorregular. As tecnologias oferecem possibilidades incríveis de aprendizagem. São contributos para a interação humana, e não substitutos».
Do lado dos alunos, Clara Palma, admite que «a tecnologia sim, é útil na faculdade». E dá um exemplo prático: «ninguém tem capacidade financeira para comprar três ou quatro livros para cada cadeira, por semestre, e é nesta matéria que a tecnologia nos ajuda».
Em conclusão, António Feijó acrescenta que «esta geração de estudantes universitários está constantemente pressionada pela questão do que vai fazer a seguir, e isso é horrível. Este devia ser o tempo de viver a acumular experiências sociais», reforçando a ideia de que os currículos devem contemplar mais partilhas de conhecimentos e aquisição de diferentes competências tanto «individuais como sociais».
E reforça estar em desacordo com a ideia de que as «universidades devem sempre preparar os jovens para as necessidades do mercado, porque é desajustado, ficaremos sempre aquém, já que a economia não é constante».
Legenda da foto (da esquerda para a direita): Clara Palma, Miguel Herdade, João Miguel Tavares, Susana Peralta, António Feijó.