Por muito que já se tenham verificado avanços nas questões de género e direitos humanos, o grande problema continua a ser de raiz, arriscando-se a ser perpetuado se não for reconhecido. A formação começa em casa, a partir do que vemos, dos exemplos que temos e do que nos é transmitido; e depois vai-se desenvolvendo na sombra da nossa infância e das vivências que serviram de exemplo. Será sempre uma questão de escolha e visão individual, mas tal não descura a importância de uma boa educação e da fomentação de valores que respeitem a igualdade de direitos, independentemente de raças, géneros, orientações.
Numa conversa relembrada pela New Yorker em homenagem a Bell Hooks, pseudónimo de Gloria Jean Watkins, falecida no passado dia 15 de dezembro, a autora cobriu tópicos como a parentalidade, patriarcado e política, tendo também em consideração a dinâmica dentro da sua própria família.
A feminista encarava a masculinidade como um regime que oprimia toda a gente, incluindo o próprio homem. “O meu pai, que era um homem muito violento e patriarcal (…) era todas estas coisas que associamos à masculinidade e, na verdade, tinha muito desdém pelo meu irmão”, revelou enquanto confessava a natureza mais afetuosa do irmão, “ele sentiu que não era masculino”. Ela apontou, fazendo menção ao seu livro publicado em 2004, alvo de muita polémica, que o problema e o que a sociedade se recusava a reconhecer era que se educavam os homens na crença de que conseguiriam o que queriam através da violência. “Ainda acredito que, se realmente queremos que o patriarcado mude, iremos ter problemas se virarmos as costas aos homens e não quisermos realmente perceber: porque são os homens tão violentos?”. Examinando casos de abuso e assédio de mulheres, a autora admite que não ficaria surpreendida se muitos dos agressores não tivessem sido, também eles, vítimas de alguma espécie de trauma, confessando que acredita que muitos homens são abusados em crianças de formas que não podem falar.
Gloria Jean Watkins disse que uma das formas de se mudar mentalidades está em desafiar a forma como se educa, corroborando ainda que o patriarcado não tem género: “só porque um rapaz está a ser educado pela mãe, não significa que a mãe não seja patriarcal na sua mentalidade, que não diga ao rapaz ‘precisas de ser um homem. Precisas de ser um homem melhor do que o falhado do teu pai’”, exemplifica.
Quando questionada sobre o passo a tomar a nível político para combater esta mentalidade, voltou a enfatizar que a educação também é política, e tem de começar pela família. Apontou que muito do trabalho que tem sido feito sobre inteligência emocional sempre se concentrou na ideia de que os homens são fechados, devendo-se então dar espaço ao homem para crescer emocionalmente e estar de facto em contacto com o que sente, para dar lugar a uma mudança na forma como eles se vêm e, por fim, como interagem.