O 3.º episódio do “Promova Talks” tem como tema “As mulheres na Tecnologia”. Carmo Palma, Managing Director na Axians Portugal e Cristina Gamito, Partner da Deloitte Portugal, com moderação do Jornalista André Macedo, partilham as suas experiências e opiniões, onde mais do que igualdade entre homens e mulheres é na diversidade que deve estar o pulsar das organizações.
Um podcast mensal, produzido pela CIP – Confederação Empresarial de Portugal, em parceria com a Randstad, que visa discutir os desafios da igualdade de género e de oportunidades no emprego para as mulheres.
Em pleno século XXI, o tema da igualdade de género nas empresas é tão real quanto a visão de um mundo profissional ainda gerido maioritariamente por homens, em que lentamente as mulheres vão ganhando uma posição de destaque. São vários os desafios, com obstáculos que dificultam a progressão profissional das mulheres na gestão, tendo uma particular expressão na área tecnológica, onde o perfil ainda é predominantemente masculino.
Segundo dados da Accenture as mulheres representam cerca de 20% do sector de TI e quase metade dos profissionais abandonam a indústria até aos 35 anos. Na área das Ciências e Tecnologia, metade dos profissionais são mulheres, mas em funções mais específicas, como a programação em código, já só representam 25%, ganhando 30% menos do que os homens.
Lançando um olhar sobre a nossa sociedade, ela ainda é marcada por uma educação tradicional, com um “cunho machista” e reforçado por uma predominância de homens no mercado de trabalho. O tema sempre polémico do sistema de atribuição de quotas, ou de uma “discriminação positiva”, parece mesmo assim não esbater essa desigualdade, com poucas mulheres a ocupar cargos de chefia e liderança nas organizações, não esquecendo ainda as diferenças salariais entre homens e mulheres, com funções e cargos semelhantes.
Em Portugal, esta realidade torna-se mais evidente num tecido empresarial maioritariamente composto por PME, muitas delas microempresas com menos de dez trabalhadores, em que a promoção da paridade ainda tem um longo caminho a percorrer. E aquilo que poderá ser um vislumbre quanto à evolução desta temática, remetendo a dados divulgados pelo Fórum Económico Mundial, o Global Gender Gap Report, ainda são necessários cerca de 135 anos para eliminar a disparidade mundial entre homens e mulheres.
Mulheres super heroínas
O caminho académico de ambas passou por uma licenciatura (Engenharia Informática), em que 10% dos estudantes eram raparigas e tal não pareceu ser um entrave ou limitação nas suas escolhas, nem um motivo de preocupação nos futuros percursos profissionais. Para Carmo Palma, “estar em minoria” não a preocupou, pois já nesse momento defendia o princípio da meritocracia. O facto de estar num contexto maioritariamente masculino, em que em 150 alunos, 15 eram raparigas, representou para Cristina Gamito um espaço de oportunidade, em que com um pouco de atrevimento e entusiamo, foi uma maneira de “provar que seria capaz”.
Tanto Carmo Palma como Cristina Gamito afirmam viver “numa bolha” dentro do contexto empresarial português, em que ao iniciar as suas carreiras há 20 anos em empresas multinacionais, já existia uma iniciativa para as mulheres e uma preocupação estrutural em manter o equilíbrio entre género. Neste contexto é importante realçar o perfil de ambas as empresas, como sendo organizações meritocráticas, onde existe uma grande preocupação com todo o processo de avaliação para que a progressão seja feita pelo mérito e a remuneração esteja de acordo, referindo nunca terem sentido um tratamento desigual pelo facto de serem mulheres.
Contudo, e apesar de entre ambas não ser essa a sua experiência, ainda hoje o peso das responsabilidades familiares recai de forma desequilibrada sobre as mulheres, o que poderá afetar a sua produtividade, quando comparadas com os homens. Para Cristina Gamito, tal acontece em determinadas situações, principalmente “quando as mulheres querem ser super heroínas, super mães, companheiras, donas de casa, e super profissionais”.
Essa atitude será reflexo da educação e de uma enraizada representação de papéis, em que homens e mulheres, enquanto rapazes e raparigas, vão recebendo estímulos diferentes o que leva a que depois sigam percursos distintos, e que, mais tarde em casa, se comportem de maneira diferente. Contudo, há uma evolução para um novo paradigma, em que em vez de o homem ajudar em casa, existe uma partilha de tarefas, sendo um verdadeiro parceiro – e “no dia em que vivermos uma verdadeira parceria em casa, a situação profissional irá mudar também”, afirma Cristina Gamito.
Discriminação positiva
A incorporação de mulheres nos quadros das empresas, desde o momento inicial, é algo que está nas agendas dos líderes, e nos planos de progressão de carreira, contudo ao olhar para o topo das organizações os cargos ocupados no feminino são ainda muito escassos.
Na opinião de Carmo Palma, apesar de concordar com a necessidade de recorrer a um mecanismo artificial para acelerar a transformação, o sistema de quotas é algo que retira o mérito às mulheres que vão progredindo, questionando se “chegou lá por mérito ou por uma quota”. Deve ser algo usado com cautela e que se esgota rapidamente por não favorecer a meritocracia, considerando por isso não ser saudável para nenhum sistema organizacional. Para Cristina Gamito, a discriminação positiva traz consigo um impacto colateral de “valorização da mulher não pela competência, mas por preencher uma quota”. Na sua opinião, os targets de paridade de género que funcionam são aqueles que desde o momento zero deem condições de igualdade, com a presença de mais mulheres, como é o caso do recrutamento.
Já Carmo Palma sugere instrumentos que apesar de mais lentos, são preventivos, como é o caso da educação e mais tarde no suporte profissional, com a criação de redes de suporte e networking de mulheres. A priori têm de existir mecanismos para atrair mais raparigas para as áreas da educação, no caso da Tecnologia, e meios para que vão evoluindo em igualdade.
Uma atitude diferente
O preconceito associado às mulheres, a uma menor disponibilidade por ter um papel em casa distinto, não faz sentido para Cristina Gamito, quando em Portugal mais de metade dos diplomados são mulheres, com um melhor desempenho do que os homens, havendo na sua opinião, um desperdício de uma enorme fonte de talento associado à crença de que “é da diversidade de ideias que surge aquilo que de melhor podemos fazer enquanto equipa”. O ponto de partida está na educação, em que se nota uma mudança de paradigma, com uma nova geração de homens que querem ser pais e ter um papel em casa, o que se revela pelo aumento das licenças de paternidade que devem, por sua vez, ser estimuladas pelas próprias organizações.
Mas à parte da educação e do que começa desde cedo em casa, entre a família, Carmo Palma chama a atenção para o facto de que “é a mulher que tem de fazer um papel de não se sentir diferente”. A forma como as mulheres vivem a sua profissão e se colocam dentro da empresa, tem sido tradicionalmente mais discreta, generalizando-se o protagonismo do homem em assumir vitórias profissionais, numa atitude masculina mais dominante e autoconfiante. Estudos feitos nesta área vêm mostrar que as mulheres só se propõe para um determinado desafio profissional quando sabem que completam todos os requisitos, enquanto os homens são mais otimistas, ou eventualmente mais atrevidos, e não têm esse nível de exigência sobre si próprios. Reforçando este princípio, sabe-se que tipicamente os homens são avaliados por potencial e as mulheres por demonstração de resultados, o que vem enviesar os padrões. “Nós, mulheres, temos de vestir a camisola do maior atrevimento, da maior autoconfiança, e exigir que o Mundo à nossa volta seja de mais partilha, em todos os contextos”, defende Cristina Gamito.
Mais do existir um modelo de empresa gerida no feminino, Carmo Palma, acredita “numa empresa gerida por um grupo diversificado, não só de género, mas em termos de cultura, aprendizagem e caminho feito que reverte numa riqueza de várias experiências de vida e pontos de vista”. Na opinião de ambas as gestoras, o sucesso das empresas passa por ser gerido pela competência, numa equipa colaborativa em contexto de diversidade e multiplicidade de ideais que vai muito para além do género.
O “Promova Talks” foi criado no âmbito do Projeto Promova, lançado pela CIP, em parceria com a NOVA SBE. Trata-se um programa de desenvolvimento e formação com o objetivo de promover cada vez mais mulheres em cargos de liderança nas empresas portuguesas, e o qual segue agora para a sua segunda edição. O “Promova Talks” é um podcast mensal, produzido pela CIP, em parceria com a Randstad, que visa discutir os desafios da igualdade de género e de oportunidades no emprego para as mulheres. Este podcast está disponível através das principais plataformas Spotify, iTunes, Google Podcasts. O 1.º episódio tem como tema “O recrutamento sem género” e o 2.º “As mulheres no setor da saúde”.