A ligação com os outros é uma necessidade humana fundamental, tão essencial para a sobrevivência como a comida ou a água. Os estudos em neurociências mostram que estamos biologicamente preparados para a ligação social, e a investigação nas ciências sociais da saúde mostra que o isolamento social e a solidão têm consequências negativas para a saúde: aumentam o nível de tensão e stress do organismo, a suscetibilidade a infeções e a probabilidade de morte precoce.
No passado, viver em isolamento, ou fora do grupo, significava ter de satisfazer sozinho as múltiplas exigências da sobrevivência. Hoje a tecnologia permite-nos viver sem nos envolver com os outros: vêm entregar-nos as compras ou as refeições a casa, vemos filmes sem ir ao cinema, trabalhamos sem sair de casa e contactamos com amigos sem estar com eles. Resolvemos os nossos problemas e relacionamo-nos sem ter de nos sincronizar com eles, isto é, sem ter de combinar os nossos movimentos, os nossos gestos e a nossa fala com os outros, ao mesmo tempo.
Num estudo realizado nos Estados Unidos, com dados do Time Use Survey, verificou-se que o tempo médio passado sozinho aumentou, entre 2003 e 2020, 24 horas por mês. Em contrapartida, o tempo passado presencialmente com amigos diminuiu no mesmo período 20h por mês. Esta evolução nos relacionamentos parece estar a ter um preço: o aumento do sentimento de solidão. De facto, há evidências claras de que, por todo o Mundo, cada vez mais pessoas se sentem frequentemente, ou quase sempre, sós. E que este número cresce principalmente entre as pessoas mais jovens, entre os mais pobres e nas pessoas que pertencem a grupos marginalizados. Há mesmo quem chame a este século o da solidão, o que é triste e preocupante. De tal modo que a Organização Mundial de Saúde declarou em 2023 a ‘solidão’ um tema de preocupação global para a saúde, e criou uma comissão para analisar este problema.
A pandemia da solidão nos locais de trabalho
A solidão também existe no local de trabalho e consiste no sofrimento psicológico associado à perceção de deficiências relacionais nesse ambiente. O Relatório Gallup (2024), sobre o estado dos locais de trabalho no Mundo, mostra que 20% dos trabalhadores se sentiu muito só no dia anterior ao inquérito, e que este valor é mais elevado junto dos trabalhadores mais jovens, dos mais precários e dos que fazem mais frequentemente teletrabalho.
Alguns estudos debruçaram-se sobre as condições que promovem a solidão no local de trabalho e apontam para o clima organizacional: os climas organizacionais têm o potencial de influenciar a qualidade das relações interpessoais vividas no trabalho. Por exemplo, ambientes de trabalho que incentivam ativamente a cooperação, a simpatia e a harmonia social entre os trabalhadores combatem a solidão, enquanto aqueles que incentivam o individualismo, a desconfiança e a competitividade promovem-na. Quanto mais tempo uma pessoa permanece num clima social negativo e exposta a relações interpessoais perturbadoras, maior é a probabilidade de se sentir só e isolada. Quanto mais os trabalhadores estiverem integrados em tarefas interdependentes que promovam comportamentos de apoio, menos se sentirão solitários.
A solidão no local de trabalho também não é boa para as organizações. Os trabalhadores que a experimentam apresentam: índices significativamente mais elevados de stress; maior intenção de rotatividade e de absentismo; menor comprometimento com a organização; menor satisfação e bem-estar. Podemos contrariar esta tendência?
Em primeiro lugar, temos de investir em ligações de alta qualidade no trabalho, marcadas pela vitalidade, mutualidade e consideração positiva.
A investigação efetuada por Jane Dutton e colegas demonstrou que a promoção de relações de elevada qualidade é muito positiva para a organização – aumentando o empenho e o envolvimento – e para o indivíduo – aumentando a satisfação e o bem-estar.
Outro tipo de intervenção que faz muito sentido, num Mundo em que vivemos cada vez mais ao nosso próprio ritmo, é aprender a re-sincronizar. A sincronização de movimentos é uma força poderosa para manter os grupos humanos unidos, como McNeil demonstrou no seu livro seminal ‘Keeping together in time’. Fazer os mesmos movimentos ao mesmo tempo que os outros provou aumentar a ligação de grupo, a cooperação de grupo, a confiança e a empatia.
Assim, para contrariar o terrível crescimento da solidão precisamos de: espaços de socialização presencial e reuniões presenciais com interações positivas; criar atividades onde a sincronização seja possível (por exemplo, dançar); promover ligações sociais durante o processo de socialização organizacional; formar os líderes em comunicação e recompensar as competências relacionais e o comportamento colaborativo. Se o fizermos, teremos empresas mais produtivas e também pessoas mais felizes.
Esta opinião foi publicado na edição nº 29 da revista Líder, sob o tema Incluir. Subscreva a Revista Líder aqui.