Caro leitor, se ainda não sabe a resposta à questão do título, se acredita que voltaremos ao “normal” e tudo não passará de uma fase difícil que tivemos de ultrapassar, talvez seja hora de perceber que o futuro do trabalho já cá está. Se foi implementado como deveria? Talvez não. Se foi (e é) uma resposta de contingência? Claro. Mas que ninguém duvide que, a partir de 2020, o trabalho remoto fará parte da vida de muitos de nós.
Nos círculos de debate dos profissionais de Gestão apresentavam-se, nos últimos anos, as grandes novidades do ponto de vista mais conceptual ou, mesmo em casos reais, de materialização das tendências da Gestão de Pessoas, sobretudo em três grandes domínios: Flexible Work Arrangements, Flexible Benefits e Work Life Balance. E as tendências já cá estão, de facto. Mas o que muitos não compreenderam é que estas políticas (e práticas inerentes, claro) fazem parte de uma linha/filosofia de gestão que assenta na unicidade de cada ser humano e que tardiamente os sistemas de organização do trabalho estavam a responder-lhe. A par de tudo isto, a evolução das tecnologias permite suportar, cada vez mais, o trabalho “anytime” e “anywhere” pelo que se justificaria que se repensassem os modelos de trabalho.
Outro tema recorrentemente presente nas discussões profissionais tem que ver com as novas gerações no mercado de trabalho e as dificuldades em os envolver e reter. Mesmo com todo este enquadramento, foi necessária uma pandemia para sermos forçados a testar as possibilidades do trabalho remoto. Mas ele cá está, e não voltaremos para trás, não podendo também ser indiferentes ao facto de muitas indústrias e profissionais não poderem trabalhar remotamente – mas isso também se dizia, por exemplo, em relação ao exercício de medicina, e a verdade é que “cá está”. É uma caminhada, e nunca voltaremos a fazer o mesmo percurso da mesma forma, porque já temos a experiência do caminho.
Sim, teremos de nos preparar para o trabalho remoto: se o trabalhador se deslocava ao local onde prestava o seu trabalho, as tecnologias permitiram que o trabalho chegue ao trabalhador. Até porque vários estudos revelam que este formato aumenta a produtividade, o bem-estar e diminuiu os custos corporativos.
Mas, que implicações traz e a que temos de saber dar resposta?
A reconfiguração dos processos de trabalho considerando, por exemplo, tempo síncrono para as tarefas que têm de ser partilhadas, e tempo de trabalho assíncrono, que cada pessoa escolha conforme as suas circunstâncias. O trabalho remoto não tem de ser “encaixado” das 09h00 às 18h00. E não tem de ter vídeo-calls a toda a hora. E tem de ter outros mecanismos de socialização. E requer diferentes atitudes e ações de liderança.
A preparação de novas atitudes e comportamentos dos trabalhadores, assente na diferença entre a responsabilidade pela tarefa e a responsabilidade pela entrega. Trata-se da mudança da forma de “pensar” o trabalho, sobretudo no que respeita às lideranças.
Não era assim que “fazíamos” e este novo cenário requer competências diferentes que temos de adquirir e desenvolver, porque trabalhar ou liderar remotamente requer competências diferentes das que mobilizamos no presencial.
Neste enquadramento, o remoto enquanto sistema de trabalho exige profunda reflexão sobre os interfaces e interdependências entre a dimensão humana e a tecnologia – e sobretudo porque esta última evolui diariamente. Por isso sim, temos de nos capacitar para que o remoto seja verdadeiramente uma possibilidade que a todos serve: ao trabalhador e ao empregador, porque é uma inevitabilidade que “ele veio para ficar”.
Ainda recentemente, Mark Zuckerberg anunciou que até 2030 metade dos milhares de trabalhadores do Facebook estarão em condição de trabalho remoto; também o mesmo havia sido anunciado por Jack Dorsey em relação aos trabalhadores do Twitter e da Square, pois o que interessa é que estejam a trabalhar onde se sintam mais produtivos. São apenas dois casos, de gigantes é certo, mas os princípios estão lá.
Acredita nesta vertente do futuro do trabalho? Se sim, prepare-se então para ser um líder de um cenário do futuro… que já é presente.
Por Isabel Moço, Coordenadora de Programas Executivos e Docente da Universidade Europeia