De acordo com dados do Observatório da Emigração, Portugal é o 8º país com maior taxa de emigração do mundo (5º da Europa), com cerca de 25% da população a residir fora do País. O que se pode fazer para contrariar esta tendência?
A Associação BRP (Business Roundtable Portugal) criou um pacote de propostas para as empresas e o Estado, com o objetivo de se criarem melhores condições para se atrair e reter o talento. A organização representa 42 das maiores empresas e grupos empresariais em Portugal, e a Líder partilha o cenário atual e parte das soluções sobre o dilema da retenção de talento no País.
A realidade, em números
Só na década passada, Portugal perdeu 742 mil pessoas para a emigração, dos quais 653 mil estavam em idade ativa e 194 mil eram licenciados – representando 10,4% da população portuguesa licenciada em idade ativa, o suficiente para aumentar a percentagem da população ativa com ensino superior em 2,4 pontos percentuais, ficando acima da média da UE.
Cerca de 20 mil licenciados – equivalente a 37% do total dos 50 mil que saem das universidades e institutos politécnicos portugueses – deixam o país todos os anos.
Em termos de investimento do Estado, os 194 mil licenciados representam uma perda de 1,9 mil milhões de euros por ano, acrescidos da perda de receita de IRS e Segurança Social dos emigrantes em idade ativa, que se estimam em 2,3 e 4,7 mil milhões de euros – o equivalente a 60% da receita de IRS cobrada em 2021.
“Portugal está a viver um verdadeiro inferno demográfico, que tem vindo a agravar-se ao longo dos anos”
“Se, por um lado, temos as gerações mais qualificadas de sempre, por outro lado, mantém-se a falta de capacidade do país para atrair e reter o talento que, lá fora, consegue encontrar uma qualidade de vida bastante superior àquela que Portugal está a conseguir oferecer”, refere Vasco de Mello, Presidente da Associação BRP.
Metade da geração Z propensa a emigrar, o dobro da geração anterior
Para conhecer os fatores que influenciam a atração e retenção de talento em Portugal, a Associação BRP, em colaboração com a Deloitte, desenvolveu um inquérito de larga escala, do qual se concluiu que 24% do talento que reside no país está propenso ou muito propenso a emigrar.
Destaca-se o facto desta percentagem subir para 48% no caso dos jovens da Geração Z (menos de 25 anos). Quando questionados sobre os fatores que influenciam a sua decisão, a maioria aponta o salário e o poder de compra como fatores prioritários, seguidos pelas oportunidades e perspetivas de evolução de carreira e pelos regimes fiscais.
As perspetivas não parecem ser positivas e anteveem um agravamento da evolução demográfica. Para o talento emigrado, a ideia de um eventual regresso está cada vez mais distante, com 61% a afirmar que não pensa voltar para Portugal.
Cerca de 55% dos emigrantes portugueses da última década tinham entre 20 e 39 anos, uma idade crítica para constituir família, o que aumenta o risco do não regresso a Portugal.
Um estudo recente confirma que 20% dos filhos de mães portuguesas nasceram fora de Portugal – valor que seria suficiente para elevar a taxa de natalidade, de 7,7%, para 8,6%, e aproximar o país dos 9,1% da média europeia.
Soluções para atrair e reter o talento jovem
A primeira sugestão passa pela definição de um comfortable living wage, (remuneração para um nível de vida confortável) ou seja, o nível salarial que permita a cada trabalhador obter um nível de vida confortável e ter acesso a benefícios essenciais, nomeadamente habitação, mobilidade, despesas correntes (como alimentação e saúde), lazer (por exemplo, uma viagem anual em família), entre outros elementos.
Além do salário, a Associação defende que as empresas possam oferecer pacotes de benefícios em espécie, que podem ir desde a disponibilização de automóvel, até soluções mais inovadoras, como um cartão mobilidade, um subsídio de habitação ou até mesmo a disponibilização direta de casa aos trabalhadores.
Do lado do Estado, a Associação BRP propõe a agilização dos licenciamentos de construção e reabilitação de habitações, e um enquadramento legal favorável ao arrendamento, de modo a aumentar a oferta de habitação e, consequentemente, reduzir os preços.
Ao nível da carga fiscal, a proposta passa pela redução do tax wedge (hiato fiscal) – isto é, do peso do IRS e da Segurança Social no custo total de cada trabalhador – sobretudo para os níveis salariais mais baixos e com prioridade para os jovens qualificados.
É proposto ainda o alargamento do pacote de complementos salariais que beneficiam de isenção de IRS e/ou Segurança Social, com destaque para as áreas da habitação e mobilidade, como forma de dar resposta à dificuldade que muitos portugueses têm em aceder a estes bens.
Já sobre os modelos de trabalho, a Associação BRP sugere às empresas: implementar uma política flexível de trabalho, incluindo o trabalho remoto, que permita acomodar as preferências dos trabalhadores às necessidades da empresa, ao mesmo tempo que possibilita aos primeiros residir em áreas geográficas com menor especulação imobiliária.