Numa economia em que tudo se pode cancelar com um clique, o desafio das marcas já não é conquistar clientes, mas permanecer relevantes nas suas vidas. O marketing evolui da transação para a relação, da métrica para o significado, e da venda para a convivência — porque a verdadeira lealdade não nasce do desconto, mas da ligação que resiste ao tempo.
O “churn” tornou-se um dos grandes riscos para as empresas. Estudos da McKinsey mostram que não é apenas a funcionalidade do produto que importa: quando a experiência e a ligação emocional falham, os consumidores preferem partir. É uma falha de relação, não de utilidade. A Deloitte reforça que muitos consumidores permanecem fiéis a marcas que sentem como companheiras do seu estilo de vida, e não como simples fornecedoras.
É aqui que a cultura se torna estratégica: apenas o que tem significado partilhado resiste ao esquecimento. Hoje, muitas marcas estão a usar novas estratégias para construir essaligação. Uma tendência emergente é a produção de séries originais para redes sociais, criadas por marcas para encantar e interagir com o público em vez de apenas vender. Segundo a Marketing Brew, este formato permite contar histórias com personagens, humor, onde o produto surge de forma subtil, gerando valor através da ligação ao público e do buzz online.
Em 2025, construir comunidade passa por equilibrar o digital com experiências físicas. Como refletido num debate da Vogue, a comunidade de uma marca moderna combina encontros presenciais (eventos, workshops, festivais) com narrativas online criativas, genuínas e coerentes com a identidade da marca, sem depender exclusivamente de influenciadores ou publicidade tradicional.
Em Portugal, esta mudança já se nota. O Tribe Social Club, em Lisboa, funciona como um espaço híbrido que combina cowork, bar e eventos culturais, onde se misturam a comunidade local e internacional. Ali, as pessoas vão tanto para trabalhar como para encontrar e pertencer a uma “tribo”. No retalho, o Lidl deu um passo invulgar ao lançar uma série social protagonizada por Laura Dutra, pensada para redes sociais. A iniciativa aproxima a marca das gerações mais jovens através de narrativa episódica, humor e storytelling digital, criando uma relação contínua com os consumidores.
A La Paz, por sua vez, constrói comunidade atravéss de estética e presença física. A marca mantém uma relação próxima com o público através de eventos presenciais, como os conhecidos stock-offs, que funcionam como encontros informais onde clientes e curiosos se cruzam. A sensação é de pertença: não é apenas comprar roupa, é participar numa cultura com identidade portuguesa.
O EY Future Consumer Index indica que os consumidores independentes valorizam ligações autênticas e menos publicidade tradicional, reforçando que a presença humana genuína se torna cada vez mais central. Relatórios da Ipsos Global Trends 2024 apontam para uma mudança de valores: muitos consumidores procuram marcas que refletem os seus ideais pessoais e constroem confiança, não apenas funcionalidades utilitárias.
Com a Black Friday a aproximar-se, esta reflexão ganha ainda mais urgência. Entre banners, contagens decrescentes e campanhas de desconto, podemos perguntar: que marcas escolhemos todos os anos? E porquê? Pelo preço, pela conveniência, ou pelo sentimento de pertença? Se a resposta não está no valor, talvez tenhamos descoberto algo mais valioso: o marketing de pertença.

