As mãos falam antes da voz. E quando falam comunicam, lideram, desafiam e iluminam. A história da Língua Gestual Portuguesa (LGP) é também a história de resistência e génio humano. Desde Jacob Rodrigues Pereira, no século XVIII, que adaptou o alfabeto manual para ensinar surdos em França, até ao reconhecimento oficial da LGP em Portugal em 1997, a língua gestual tem sido um instrumento de inclusão, criatividade e empoderamento.
Amanhã, no Dia Nacional da Língua Gestual Portuguesa, surge a oportunidade de refletir sobre a importância cultural e social da LGP, e também sobre como empresas em Portugal e no mundo estão a transformar este conhecimento em inovação e liderança inclusiva. Um gesto traduz-se em serviço, confiança e experiência do cliente, e as organizações que o percebem estão a liderar um caminho de diferenciação e responsabilidade.
Um pouco sobre a história da língua gestual
As línguas gestuais existem há séculos como meios naturais de comunicação entre surdos. No século XVIII, figuras como Abbé de l’Épée (1712–1789) em França começaram a sistematizar a educação de surdos, criando métodos de ensino baseados em sinais e alfabeto manual. Jacob Rodrigues Pereira (1715–1780), português nascido em Peniche, foi pioneiro na adaptação do alfabeto manual para ensinar surdos em também em terras francófonas, sendo considerado um precursor da educação moderna para quem vive com esta condição.
Nos Estados Unidos, no início do século XX, havia um movimento crescente de tentativa de substituir línguas gestuais por oralismo nas escolas, ou seja, ensinar surdos apenas a falar e ler lábios. Foi nesse contexto que George Veditz (1861–1937), então presidente da National Association of the Deaf, filmou em 1913 Preservation of the Sign Language, defendendo que a ASL deveria ser preservada como língua viva e completa, antes que políticas educacionais a eliminassem. Posteriormente, William C. Stokoe Jr. (1919–2000), na Universidade Gallaudet, demonstrou cientificamente que a ASL tinha gramática, sintaxe e estrutura próprias, validando-a como língua natural. Lottie Louise Riekehof (1920–2020) abriu caminho à profissão de intérprete nos EUA, criando normas e formação profissional, consolidando a tradução gestual como carreira reconhecida.
Em Portugal, a Língua Gestual Portuguesa (LGP) só foi reconhecida constitucionalmente em 1997, garantindo direitos a educação, trabalho e participação social para pessoas surdas. Desde então, projetos culturais como o coro inclusivo ‘Mãos que Cantam’ (2010, Universidade Católica Portuguesa) têm mostrado que a LGP é também expressão artística, emoção e criatividade, ampliando a visibilidade das comunidades surdas.
Empresas portuguesas a liderar com inclusão
Várias organizações portuguesas estão a integrar a Língua Gestual Portuguesa (LGP) nos seus serviços, mostrando que inclusão e inovação podem caminhar lado a lado. Estas iniciativas têm impacto direto na experiência do cliente, mas também na cultura interna das empresas, reforçando valores de acessibilidade e responsabilidade social.
Vodafone Portugal – A Vodafone deu um passo pioneiro ao disponibilizar atendimento em LGP via vídeo-chamada, permitindo que clientes surdos acedam a serviços de forma direta, intuitiva e empática. Esta abordagem implica formação contínua dos colaboradores e adaptação de processos, mostrando que a inclusão pode ser integrada de forma eficiente no dia a dia da empresa. A iniciativa fortalece a ligação com os clientes surdos e evidencia um compromisso com uma comunicação acessível a todos.
CTT – Correios de Portugal – Os CTT implementaram um serviço nacional de vídeo-interpretação em parceria com a Serviin, garantindo que clientes surdos possam obter informações e realizar operações sem barreiras. A escala nacional desta iniciativa, presente em praticamente todas as regiões de Portugal, demonstra que acessibilidade é uma estratégia de serviço capaz de transformar a experiência do utilizador. Ao colocar a LGP no centro do atendimento, os CTT reforçam a inclusão como um valor corporativo estruturante.
Fundação MEO – Lojas com Sentido – A Fundação MEO expandiu a acessibilidade em 160 lojas com atendimento personalizado em LGP, combinando tecnologia e formação especializada de colaboradores. Esta iniciativa permite que cada cliente surdo seja atendido com autonomia e dignidade, sem barreiras comunicacionais. A estratégia evidencia como o investimento em formação e tecnologia traduz-se em benefícios tangíveis: maior satisfação do cliente, fidelização e fortalecimento da imagem institucional da empresa.
Serviin – A Serviin é a parceira estratégica destas iniciativas, fornecendo serviços de vídeo-interpretação em LGP para empresas portuguesas. A sua atuação permite que organizações integrem a língua gestual sem necessidade de internalizar todos os recursos, combinando flexibilidade, escalabilidade e profissionalismo. A existência de empresas como a Serviin demonstra que a acessibilidade é também um mercado e uma oportunidade de inovação, criando valor para todos os intervenientes.
Exemplos internacionais
A acessibilidade em língua gestual não é apenas uma prioridade em Portugal. No estrangeiro, grandes empresas também têm integrado de forma sistemática a língua gestual nas suas operações, combinando inclusão, inovação e experiência do cliente.
Microsoft – Sign Language Studio – A Microsoft criou o Sign Language Studio, uma iniciativa que combina formação e integração de intérpretes em eventos e produtos da empresa. Esta plataforma permite que conferências, lançamentos e interações digitais sejam totalmente acessíveis a utilizadores surdos, sem comprometer a experiência nem a fluidez do evento. Mais do que cumprir normas de acessibilidade, a Microsoft aposta na normalização da presença de intérpretes, reconhecendo que a inclusão deve ser parte integrante do design de produtos e serviços.
Starbucks – Signing Stores (EUA) – Nos Estados Unidos, a Starbucks foi pioneira com as Signing Stores, lojas geridas por funcionários surdos e com atendimento totalmente em American Sign Language (ASL). Esta iniciativa vai além da acessibilidade: transforma a experiência do cliente, promove a visibilidade das comunidades surdas e inspira uma cultura corporativa mais inclusiva e empática. Além disso, demonstra que a inclusão é também uma estratégia de diferenciação e inovação, mostrando que a experiência do cliente e a responsabilidade social podem caminhar juntas.
Como implementar LGP na sua empresa
Avaliar necessidade – Antes de qualquer ação, é crucial mapear as áreas de contacto com o cliente que mais beneficiariam da interpretação em LGP: lojas físicas, call centers, eventos ou plataformas digitais. Cada gesto traduz-se em clareza, confiança e experiência de excelência. É uma intervenção estratégica, não simbólica.
Escolher parceiro ou formar equipas internas – A empresa pode optar por serviços externos, como a Serviin, garantindo flexibilidade e profissionalismo, ou investir na formação de intérpretes certificados internos. Em ambos os casos, a inclusão passa a ser parte da operação diária e não apenas um adereço corporativo.
Comunicar à comunidade – Tornar visíveis os serviços inclusivos é fundamental. Informar clientes surdos sobre atendimento em LGP, sinalizar lojas acessíveis ou disponibilizar vídeos explicativos demonstra que a organização valoriza cada utilizador e reconhece a diversidade como vantagem competitiva.
Medir impacto – A avaliação do impacto transforma a inclusão em resultados tangíveis: satisfação, retenção e lealdade do cliente surdo, valorização da marca, desenvolvimento de competências internas e fortalecimento de uma cultura corporativa empática. Mais do que métricas, cada gesto torna-se uma oportunidade de reforçar a liderança inclusiva.
Benefícios tangíveis e culturais – Empresas que incorporam a LGP ganham reputação, mas também resultados concretos: maior fidelidade dos clientes, valorização em responsabilidade social, fortalecimento da cultura interna e formação de profissionais certificados. Um gesto que inclui é um gesto que transforma.
A liderança que se vê nas mãos
A LGP demonstra que liderança não pode ser medida apenas em vendas ou quotas, mas em capacidade de ouvir, ver e incluir. Do pioneirismo de Jacob Rodrigues Pereira à implementação tecnológica das empresas portuguesas, a mensagem é clara: gesto é poder, e inclusão é liderança.
Num mundo cada vez mais automatizado, em que algoritmos e ecrãs dominam a comunicação, a língua gestual recorda-nos o essencial: o humano deve estar no centro da máquina, e a verdadeira inovação é aquela que não deixa ninguém para trás.




