Segunda-feira, 9h08, numa empresa de Braga, a entrega de uma encomenda a um cliente relevante atrasou-se bastante, o serviço de apoio está em polvorosa e alguém pergunta: «Porque é que a maioria dos clientes não nos escolhem duas vezes seguidas?». A resposta terá pouco a ver com o que o slogan publicitário da empresa refere, já que a centralidade no cliente é cultura e não uma mera campanha. E a cultura nasce da liderança que tem o poder de definir valores e princípios, e, principalmente, pautar comportamentos.
Mas… por onde é que começa? Pela visão e pelos valores em ação. Os líderes que dão a cara onde importa, que revêm pedidos com as equipas, que analisam as causas quando se perde um negócio e que exigem que o impacto no cliente pese em cada decisão tornam a centralidade no cliente inevitável. Sem o patrocínio visível e comprometido do topo da hierarquia, as iniciativas morrem nas apresentações. Em sentido oposto, com a presença efetiva e os comportamentos da liderança, a cultura ganha tração e sobrevive à fadiga das modas.
Para que a liderança seja promotora e facilitadora de experiências coerentes há que quebrar os silos internos. Marketing, Operações, Infraestrutura Tecnológica e Vendas fazem a composição da experiência e, por isso, terão de medir a mesma jornada e ser orquestrados por um mesmo responsável. Os dados dão uma visão 360º do cliente, mas é a liderança que define as regras, que devem contemplar: reuniões rápidas diárias com indicadores de cliente, fóruns de análise das causas-raiz, análises focadas e não obcecadas na procura de culpados e decisões registadas com o critério ‘efeito no cliente’. Desta forma, consegue-se liderar a transformação, a estratégia ganha transversalidade, reforça-se a maturidade da cultura e esta torna-se mais imune aos eventuais ímpetos decorrentes de mudanças de chefias.
E as pessoas? A cultura centrada no cliente vive de confiança e empatia nos processos e de menos ego nas salas de reunião. As equipas com autonomia para decidir com base em racional de cliente, mesmo quando o procedimento sugere outra coisa, têm o poder de transformar atritos em confiança. Neste contexto organizacional, valoriza-se a responsabilidade individual, premeia-se a meritocracia, distinguem-se os comportamentos que aceleram o alcançar dos objetivos e incentiva-se a partilha de conhecimento, a prevenção e o feedback útil.
O que se mede melhora. O que se premia multiplica-se. E o que não se observa apaga-se. Porque fica difícil construir cultura sem um quadro de indicadores, importa muito medir o que é relevante. E, por isso, haverá que atender a indicadores ligados aos resultados financeiros e que permitem orientar os investimentos, tais como: taxas de repetição de compra e retenção, valor vitalício do cliente, níveis de satisfação e esforço do cliente, entre outros.
Nesta era digital, há um ponto a destacar: a tecnologia já faz quase tudo, mas ainda não lidera. A inteligência artificial escreve, analisa e executa, mas não inspira confiança, não resolve conflitos difíceis e não transforma pessoas por dentro. E, mesmo que um dia nos aproximemos deste cenário, continuaremos a preferir líderes humanos que dão sentido e direção. Por isso, os profissionais que mais se destacam são os que treinam o que os algoritmos não têm: inteligência emocional, visão estratégica, influência ética e liderança genuína. Agora, uma liderança de 360º implica que cada líder tenha a vontade de aprender todos os dias e que procure dar primeiro o exemplo. Assim, o que nos pode tornar insubstituíveis aprende-se, pratica-se e comprova-se no terreno.
E as evidências? Quando a experiência do cliente (CX) é tratada como disciplina de gestão, os resultados aparecem. Estudos recentes da McKinsey & Co. mostram que desenhar e gerir bem a CX tende a elevar a satisfação até 20%, a aumentar a conversão até 15% e a reduzir o custo de servir até 50%. Além disso, as estratégias de crescimento alavancadas na experiência reforçam as vendas cruzadas e geram ganhos adicionais de quota nas carteiras de clientes.
Voltemos à empresa de Braga. O que a organização mudou foi decisivo: antes de avançar com qualquer investimento, a direção passou a perguntar “que efeito terá isto no cliente?”. Ligou 30% do bónus semestral ao NPS (Net Promoter Score) e à taxa de retenção, bem como criou reuniões curtas e diárias para decisões tomadas com base em dados e indicadores. Após oito semanas, já se notava a diferença. Ao fim de dois trimestres, a repetição de compra subiu oito pontos percentuais e o valor vitalício do cliente aumentou 12%. Causa e efeito à vista: a liderança decidiu, a cultura que respondeu e os resultados que confirmaram.
Conseguir o compromisso dos profissionais é um dos pilares do CC Loop, o referencial estratégico para a centralidade no cliente. Quando as equipas dominam o porquê, sabem o como e veem o efeito, verifica-se que o ‘vestir a camisola’ deixa de ser uma metáfora e passa a ser orgulho. No livro ‘Rota de Valor – O Poder da Centralidade no Cliente’ aprofundam-se as metodologias, os casos práticos e modelos de governação.
Então, a sua equipa veste a camisola? Se o ‘sim’ ainda não é mensurável em indicadores, proponho que comece hoje: clarifique a visão, redesenhe uma jornada crítica, ligue métricas a incentivos e lidere pelo exemplo. Construir uma cultura forte passa pelo que repetimos consistentemente, sobretudo quando é difícil.