Não é nos processos que a mudança se bloqueia, mas nas conversas que não acontecem
Mudar é mais do que reorganizar equipas ou redesenhar processos. É lidar com o que não se vê nos relatórios: o desconforto, as perguntas, os silêncios. É isso que torna a mudança exigente. Porque mexe em rotinas, desafia certezas, obriga a largar o que era familiar mesmo antes de se confiar no que vem a seguir.
A maior parte das dificuldades numa transição não está na estratégia. Está nas pessoas. Nas emoções que ninguém mapeia. Nos receios que não se dizem. Na ausência de espaço para pensar com calma. E quando não há espaço, há resistência. Não porque as pessoas não queiram mudar, mas porque não se sentem preparadas. Ouvidas. Parte da equação.
É aí que entra aquilo que tantas vezes tratamos como lateral, quando é, afinal, central. Competências que abrem caminho e permitem atravessar fases instáveis com clareza, equilíbrio e ligação. Falamos de escuta, pensamento crítico, empatia, adaptabilidade, humildade para ajustar a rota e contribuir com mais presença. São essas capacidades que evitam que uma equipa se feche, que um líder se isole ou que uma organização estagne quando o caminho se torna menos previsível, mas necessário.
Desenvolver estas competências não é um luxo. É uma necessidade. E não se faz por obrigação ou com pressa. Faz-se com tempo, prática e atenção. Práticas estruturadas de desenvolvimento, como o coaching, quando usadas com intenção, são ferramentas que podem ajudar a abrir esse espaço. Não ensinam respostas, mas ajudam a fazer as perguntas certas. Permitem que quem lidera se encontre com a sua forma de estar, e que quem executa se reconheça no processo. Mais do que técnica, são convites à clareza. A parar. A pensar melhor. A sentir com lucidez.
Quem lidera, neste contexto, precisa mais de presença do que de controlo. Precisa de saber escutar, de criar confiança, de sustentar decisões que envolvem e responsabilizam sem esmagar. Precisa de saber como estar, mais do que saber o que dizer.
A resiliência, na mudança ou noutros processos, não depende da robustez da estrutura. Depende da flexibilidade de quem a habita. De como se reagem às incertezas e ao desconhecido, de como se acolhem os erros, de como se mantêm os vínculos quando as respostas ainda não chegaram. E de como se cuida do essencial: as pessoas, mesmo no meio do turbilhão.
Preparar uma organização para lidar com a mudança não é construir mais camadas. É muitas vezes simplificar. Criar nitidez. Estimular autonomia. Deixar que as pessoas participem no que estão a viver, e não apenas que cumpram o que lhes foi pedido.
Estas competências humanas não são uma moda. São a base do que nos mantém atentos, conectados, disponíveis. Num contexto exigente como a gestão da mudança, em que tanta coisa muda de fora para dentro, são estas capacidades que nos mantêm inteiros por dentro. E são elas que permitem que uma equipa não apenas aguente o impacto, mas saiba encontrar o seu caminho no meio dele.
Resiliência não é resistir. É conseguir seguir em frente sem perder o que importa.
E isso começa, quase sempre, em conversas que não se delegam nem se automatizam, apenas se vivem e não cabem em folhas de cálculo. Na mudança, como na liderança adaptativa, é sempre das pessoas que depende o futuro.
Este artigo foi publicado na edição nº 31 da revista Líder, cujo tema é ‘Decidir’. Subscreva a Revista Líder aqui.