O Fórum Económico Mundial tem uma rede de jovens lideranças a que chama Global Shapers, os escultores globais. São mais de 10 608 jovens lideranças em todo o mundo, espalhados por 147 países e com 444 hubs. Em Portugal são já mais de quarenta e em conjunto com a Líder refletiram sobre o tema de capa e deram as suas respostas que nos obrigam a pensar que há muito a fazer. Desde a necessidade de um olhar renovador para a forma como organizamos o nosso sistema eleitoral, à convocatória para não esquecermos os ensinamentos de Péricles sobre democracia, até às questões tão elementares e estratégicas como a casa que habitamos e o que comemos. É tempo pois de voltar à política com o olhar destes quatro escultores do futuro.
A POLÍTICA PARA AS PESSOAS OU AS PESSOAS NA POLÍTICA?
A democracia é um conceito que varia muito em função do contexto social em que vivemos. Por exemplo, dentro daquilo que entendemos ser o conceito democrático por nós a seguir, as democracias ocidentais, existe uma enorme diferença de entendimento. Se na Europa a democracia é percebida como a universalidade do direito ao voto, no outro lado do Atlântico tal não sucede, a democracia advém mais da participação cívica e conquista de direitos (inclusive o próprio acesso a poder votar).
Com isto, quero dizer que não existe uma solução perfeita para o dilema que cada vez mais se torna evidente no cenário político português – a falta de participação das pessoas na política, ou melhor, nos partidos políticos. A democracia é (e deve ser) um processo de construção permanente e de melhoramento. E nesse aspeto a própria Constituição portuguesa prevê essa evolução e meios de alteração das regras de representação democrática e de eleição. Neste sentido, era compreensível que no pós-25 de Abril, o sistema eleitoral fosse reservado apenas a partidos políticos e direcionado para a criação de maiorias que permitissem estabilidade.
Com o amadurecimento da sociedade e das instituições, a política de debate e negociação tem de estar mais presente, até porque vivemos numa sociedade mais complexa e diversificada. E isso é verificável num mundo em que vários projetos cívicos vão surgindo e inclusive são liderados por jovens – é caso disso o projeto 100 oportunidades dos Global Shapers Lisboa.
A política nunca faltou, muito pelo contrário, está mais presente e as pessoas mais interventivas do que nunca, mas o panorama político não acompanhou as novas formas organizativas, nem deu voz ou espaço para o diálogo, obrigando muitas vezes a seguir formas de estar que não vão ao encontro dos valores preconizados. Acredito que cada vez mais os partidos políticos tradicionais se estão a aperceber deste facto e a tentar enquadrar nas suas listas as chamadas pessoas independentes.
Por isso, talvez seja importante refletirmos se não está no momento de tirar um pouco da hegemonia partidária que existe nas eleições em Portugal, e tornar o sistema aberto a novas formas de participação mais efémeras e independentes – como, por exemplo, é o caso de um sistema misto que inclua círculos uninominais, proposta recentemente apresentada pela SEDES (Associação para o Desenvolvimento Económico e Social) e da APDQ (Associação para uma Democracia de Qualidade).
Termino com uma citação de Jorge Sampaio, numa entrevista ao Expresso em 2018, que dizia: “Se se quer uma democracia com gente capaz, é preciso oferecer condições”. Talvez essas condições estejam para além dos partidos.
Por Diogo Vieira da Silva, Curador dos Global Shapers do Fórum Económico Mundial, Lisboa Hub.
Leia o artigo na íntegra na edição de outono da revista Líder.
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