No final de agosto, um editorial do Financial Times lamentava o declínio da leitura. Esse lamento tem sido repetido por este vosso criado que, de vez em quando, divulga uma lista de livros – lidos, em leitura, a ler. Como estamos a chegar ao Outono, por que não recomendar livros chegados há pouco ou relativamente pouco tempo. Aqui fica o pedido: não leiam só o telemóvel. Há melhores propostas, como estas.
Giuliano da Empoli tornou-se uma pequena celebridade. Ele mostra-nos os meandros da política contemporânea de uma forma vívida, nomeadamente com a ascensão do digital. Neste A Hora dos Predadores (Gradiva) vemos o lado ‘de dentro’ da política, como no caso extraordinário do sequestro, no Ritz, da família “real” saudita por MBS. Digno de filme! Como ele diz, em política não é a queda que é dolorosa: sofre-se o tempo todo. E se não se sofre, podemos acrescentar é mau sinal. Para os outros.
O Cérebro Ideológico, de Leor Zmigrod (Dom Quixote) explora temas contemporâneos importantes, nomeadamente o modo como as redes sociais afetam a nossa maneira de pensar ideologicamente: tornamo-nos mais rígidos, porque as ditas redes nos servem mais daquilo que já pensamos. O que nos faz pensar menos criticamente. Maus sinais dos tempos, aqui descodificados…
Uma das grandes edições deste ano é Uma história africana de África, de Zeinab Badawi (Presença). O desconhecimento dos europeus levou ao preconceito de que o grande continente não teria história. Badawi vem corrigir essa ignorância, conduzindo-nos numa viagem pelos povos e tradições africanos. Uma grande viagem para este outono.
E outra grande viagem pode ser feita com Muito para além do mar, de José Manuel Garcia (Presença). Numa altura em que simplesmente falar dos descobrimentos pode ser problemático, importa tratar o tema para que conheçamos melhor a nossa história; não descontando as crueldades, nem tudo reduzindo a tragédias e desonras.
Em boa hora chegou Espírito Shaolin, de Shi Heng Yi (Lua de Papel), não porque esteja a pensar desenvolver novas competências marciais mas por um par de acontecimentos não relacionados. Por um lado, porque Shi Yongxin, o monge CEO, chefe do mosteiro em Henan, foi acusado de corrupção, mais uma evidência do princípio “faz o que digo…”. Por outro porque o meu médico de família me recomendou alongamentos como os que vêm explicados neste volume. Estão identificados; agora é só fazer. Reencontrar-me-ão lá mais à frente refrescado pelo espírito shaolin.
Um objeto único: Bater sempre também cansa … mas às vezes até é pouco (Guerra e Paz), é uma memória epistolar de Luiz Pacheco aqui trazida por Nicolau Santos. Trata-se de um pequeno volume com cerca de setenta páginas, que se lê pensando na importância para a sociedade de pessoas como Luiz Pacheco, cuja missão é dessacralizar as vacas sagradas. Uma delícia de humor pachequiano, bem conduzida por Nicolau Santos.
E termino com um clássico: a Dom Quixote reedita Os Filhos da Meia Noite, de Salman Rushdie. Importa ler Rushdie sobretudo por ser um grande escritor. Mas ler Rushdie também significa defender a liberdade. Rushdie tem sido perseguido e atacado no ocidente pelo islamismo político. A sua vida-obra é um grito pela liberdade. Mas agora celebremos o escritor. Grande. Começa assim: «Nasci na cidade de Bombaim … um certo dia». Assim fala Saleem que tem tantas histórias para contar. Ouçamo-las!