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A lógica desta guerra já não é a lógica do ator racional – a lógica agora é a das contingências

29 Março, 2022 by suporte

Para entender melhor a Guerra na Ucrânia é importante conhecer a história daquela região do Mundo; o modo como ao longo dos anos têm desenvolvido as suas relações internacionais, a sua geopolítica, a sua posição estratégica no cenário político, económico e social. A Líder falou com Heitor Romana, Professor Catedrático em Estudos Estratégicos pela Universidade de Lisboa, ISCSP, também Doutor em Ciência Política pelo ISCSP, e Docente de Geopolítica, Tomada de Decisão Estratégica e Intelligence Estratégica. O facto de ter sido já coordenador e autor de vários estudos sobre Intelligence Estratégica, da China à Rússia, dá-lhe mais do que credibilidade para nos apontar as pistas para o entendimento do que verdadeiramente opõe a Ucrânia à Rússia, ou melhor, o que oporá a Rússia ao mundo Ocidental. E a história é longa e antiga. Vamos contá-la em quatro capítulos, este é o primeiro.

 

Por: Catarina G. Barosa Foto: DR

 

Apesar de, por vezes, os factos ao longo do tempo parecerem indiciar este desfecho, Heitor Romana refere que “o facto de eu considerar que mais tarde ou mais cedo este cenário se iria concretizar, não significa que estejamos aqui na presença de um destino que tinha, inevitavelmente, de se cumprir e em relação ao qual a nossa posição seria de mero espectador e de aceitarmos isso” e adianta: “O Mundo no Pós Segunda Guerra Mundial viveu no quadro daquilo que eu designo de ‘lógica das consequências’. O conceito ‘lógica das consequências’ não é meu, é de um grupo de investigadores da Oxford que desenvolveram esta ideia que assenta na presunção de que as tensões e os conflitos entre os Estados, na procura da realização dos seus fins estratégicos, sejam eles quais forem, têm sempre o seu script, ou seja, um argumento auto justificativo.” Este modelo da “lógia das consequências” está também associado ao modelo do “ator racional”. Segundo Heitor Romana isso explica-se da seguinte forma: “Se um dos atores do sistema, dos que estiverem em confronto, por exemplo como sucedeu durante a Guerra Fria entre o Bloco de Leste, dirigido pela União Soviética, e o Bloco Oeste, dirigido pelos Estados Unidos; ou se quisermos também entre a NATO versus Pacto de Varsóvia, podemos concluir que as tensões existiam, mas os confrontos nunca se deram, ou seja, tratavam-se das proxy wars; as guerras feitas através de outros, através de terceiros, porque a lógica das consequências (com atores racionais) dizia-nos uma coisa que nós todos intuíamos, das crianças aos adultos: se houvesse um confronto direto entre os Estados Unidos e a União Soviética seria o fim do Mundo, o Mundo que nós conhecíamos. Mas também tínhamos a certeza de que isso não iria acontecer, com base no designado ‘equilíbrio do terror’. O terror era tão grande entre os dois blocos, a possibilidade de destruição total era tão grande, que nunca se efetivaria, por paradoxal que parecesse. E porque é que isso nunca aconteceria? Porque predominava o ‘modelo do ator racional’.”

A guerra feita através de atores racionais segundo o modelo da lógica das consequências permitia que se fizesse uma “definição muito clara dos dois lados, dos custos/benefícios envolvidos. Isto é, diríamos assim: o Bloco dirigido pelo Walter Washington tinha a leitura dos códigos do Bloco de Moscovo e o Bloco de Moscovo fazia a leitura dos códigos do Washington. Os atores envolvidos tinham os mesmos códigos. O confronto era feito nas chamadas proxy wars. A História das Relações Internacionais do Pós-Guerra, portanto, a Guerra Fria, está cheia de casos em que há o envolvimento indireto dos Estados Unidos e da Rússia Soviética sem haver a possibilidade de um confronto direto”.

Contextualizados estes modelos de atuação no âmbito das relações internacionais entre estados, é fundamental perceber se esses modelos se verificam nesta guerra a que assistimos entre a Rússia e a Ucrânia, segundo Heitor Romana, “a última vez que tínhamos assistido, no século XX, a uma quebra da lógica das consequências, isto é, o modelo do ator racional em que, se dizia, ‘bem, se eu der um passo errado, as consequências são de tal ordem que podem levar à minha destruição, e logo não dou o passo porque é racionalidade pura, científica, a dominar uma decisão estratégica’, a última vez que houve uma falha no modelo do ator racional, foi antes da Constituição dos dois Blocos, no início da Guerra no Pacífico, entre os Estados Unidos e o Japão. No dia sete de dezembro de 1941 o ataque japonês à frota americana do Pacífico, que praticamente ficou destruída e ninguém acreditava. A Operação Relâmpago é uma surpresa extraordinária porque os estrategos norte-americanos, os decisores políticos militares e a Intelligence norte-americana não acreditavam que os japoneses se atrevessem a atacar os Estados Unidos porque as consequências seriam extraordinariamente nefastas. Como foram, aliás. Logo, o que predominava nessa altura era o racional, ou seja, o ator que sabe ao que vai e, por isso, não vai correr riscos, porque os riscos são tão elevados que podem levar à destruição do Japão enquanto país como existia, e que foi o que aconteceu”.

Este modelo do ator racional permite estabelecer equilíbrios entre potências que têm também à sua disposição o poder nuclear, o que tanto assunta o Mundo. O poder nuclear deve funcionar de acordo com esta lógica das consequências e tendo na sua base o ator racional, como poder dissuasor e não como poder efetivo destruidor ou para atacar. Heitor Romana confirmam que “nunca seria para ser utilizado. Ambas as partes tinham esse código. Por isso é que eu lhe chamo ‘os códigos’, partilhavam o mesmo código geopolítico nesse sentido. Esse era o paradigma existente, que assentava no tal equilíbrio do terror, na deterrence, na dissuasão, mas que era uma dissuasão mútua. É evidente que nós fazemos a leitura de que NATO, o Bloco Ocidental, as Democracias Liberais ou Estados, enfim, os Estados do Ocidente, nessa altura os Estados partilhavam a conceção do Atlântico Norte, estava no ar que funcionavam assim, e a deterrence, a dissuasão de um Bloco acontecia porque sabiam que o outro Bloco tinha a capacidade para atacar. Aliás, o fim da União Soviética acontece quando a União Soviética se apercebe que, através da Guerra das Estrelas, no Programa da Guerra das Estrelas (Ronald Reagan teve um papel muito importante), há um desequilíbrio, mas é um desequilíbrio a favor do Ocidente, e não a favor da União Soviética. Esse desequilíbrio, dentro da Guerra das Estrelas, é o desequilíbrio que vai levar ao fim da União Soviética, ao fim de um regime, ao fim de um sistema político-ideológico baseado no desequilíbrio do terror. Esta é a minha leitura porque outros fatores, naturalmente, confluíram para que isso se verificasse”.

Retomando a Operação Relâmpago levada a cabo pelo Japão, é esta surpresa estratégica que dá origem, segundo Heitor Romana, ao desenvolvimento de vários estudos sobre o comportamento japonês e acaba por ser graças a esse ataque que é criado o serviço de Intelligence que vai dar lugar à CIA (Office of Strategic Service); formada por intelectuais, por cientistas e académicos, os mesmos que vão estudar o comportamento racional, ou irracional, de Hitler, e vão estudar o comportamento racional ou irracional do Imperador japonês. “Era preciso perceber como é que o modelo do ator racional estava a perder peso, por que estava a perder força. Era facto que, e voltando à Guerra Fria e aos anos 60, 70 e 80, o modelo do ator racional sempre funcionou. Na crise dos mísseis de Cuba, em que estava iminente um ataque nuclear, um ataque feito pelo Khrushchev contra os Estados Unidos, e em que estava também iminente a retaliação norte americana contra a União Soviética, mas nada aconteceu”, explica Heitor Romana enfatizando a força do modelo do ator racional.

Ainda sobre a evidência da força do modelo do ator racional motivado por uma lógica de consequências, uma história particular que nos conta Heitor Romana: “Lembro-me quando tinha 14 anos, de acordarmos de manhã e ouvirmos rádio – nessa altura não havia televisão – ‘A agência Reuters anuncia grave crise das relações entre os Estados Unidos e a União Soviética, iminente uma crise que pode redundar num ato nuclear inesperado’. E o que fazíamos nós? Cada um seguia a sua vida, levávamos a vida normal, porquê? Ninguém acreditava que isso pudesse acontecer, tal como não aconteceu dentro desta lógica do modelo do ator racional. Dormíamos descansados, vivíamos descansados, porque era o bluff das Relações Internacionais. Era o bluff entre superpotências”.

Mas podemos agora viver assim tão desancados quando Putin nos enfrenta com a ameaça nuclear? Para podermos responder a esta pergunta é relevante perceber que com o “fim da União Soviética, a lógica anterior dá lugar a um multissistema que nunca chegou verdadeiramente a afirmar-se, tal como esta crise vem demonstrar, nunca chegou verdadeiramente a encontrar o seu ajustamento. Andamos desde 1990 à procura de um ajustamento, e, trinta anos depois, esse ajustamento não se verifica. A partir de dada altura começamos a perceber que há sinais, começamos a verificar algumas brechas do modelo do ator racional, da lógica das consequências. Essas brechas estavam a dar lugar àquilo que eu designo da ‘lógica da contingência’ e o que é que isso significa por exemplo em termos de risco da atividade empresarial e do risco geopolítico?”, explica e questiona Heitor Romana.

A nova ‘lógica da contingência’ remete-nos para territórios de gestão de crises, de incertezas, como reforça o professor Heitor Romana: “Porque a lógica que vivemos é de uma constante crise. Essa é a dialética da vida das Relações Internacionais, mas ter a capacidade para nos anteciparmos às crises é que se transformou, e isso é que é para mim verdadeiramente novo. As crises que antecipávamos, vivíamos com elas. Agora, saímos de casa e não sabemos como é que vamos regressar. Saímos de casa com a cadeia de fornecimento definida, e quando chegamos a casa a cadeia de fornecimento já é outra e não sabemos como vai ser o dia seguinte. E nessa medida, a lógica da contingência tomou conta das Relações Internacionais, e da geoeconomia, e da geopolítica, e da vida dos empresários.”

Mas retomando os sinais de que alguma coisa estava a mudar, nesta ‘lógica das consequências’ dando lugar a uma outra ‘lógica de contingências’, veja-se a inimaginável saída do Reino Unido da União Europeia. Mais ainda: “Quando se dá a crise de 2014 na Ucrânia, que leva à tomada da Crimeia por parte da Rússia, a pergunta que fazemos é a seguinte: isto não era suposto acontecer? Não se fez nada, ninguém fez nada a pensar ainda na ‘lógica das consequências’. O ato estava praticado, a ação estava executada, mas quais foram as consequências? Não houve consequências. Podemos especular porque é que não houve consequências. A perceção que se tem, no meio académico, mas ninguém queria acreditar, era de que a Rússia iria reclamar um dia, sobretudo a Crimeia. Pois há um sentido histórico: a Crimeia é estratégica para a Rússia, é na Crimeia que está uma base naval russa que lhe permite, a partir do Mar Negro – se os turcos levantarem problemas – chegar às águas quentes do Mediterrâneo. Uma importância geoestratégica enorme. É evidente que podemos dizer: ‘mas os russos tinham lá uma base, a Ucrânia tinha-lhes permitido a concessão que era renovável, mas isso não era suficiente’.”

Este exemplo da anexação da Crimeia por parte de Rússia serve também como um sinal de que o modelo do ator racional estava a ficar abalado. Pois, segundo nos explica Heitor Romana: “Acontece uma coisa que nós julgámos que não ia acontecer. Porque tínhamos para nós, e agora eu falo enquanto analista geopolítico, a perspetiva de que a Ucrânia era uma espécie de sacro santo, que nunca ninguém tocaria na Ucrânia, porque a Ucrânia servia os dois lados em termos de tampão geopolítico. Servia o Ocidente, servia a Europa, os Estados Unidos, e servia à Rússia.”

Outros foram os sinais que se acrescentam a este cenário de mudança, “nos anos 2006, 2007, 2008, já a Ucrânia e a Geórgia tinham dado sinais de que, eventualmente, poderiam fazer parte da NATO. Nessa altura, a Rússia reagiu mal. Contudo, a Rússia, surpreendentemente, nessa altura não atuou. A acrescer, e para agravar este modelo de análise, acontece a eleição do Presidente norte-americano Donald Trump. A eleição do Trump é o exemplo máximo do fim da ‘lógica das consequências’. Os Estados Unidos elegem um homem com um perfil muito peculiar, foge dos cânones dos corredores de poder em Washington. Eu vivi em Washington um ano, há muitos anos, e apercebi-me como democratas e republicanos, no essencial, estão de acordo. Como, entre a elite de Washington e a elite de Georgetown, existe um acordo quanto à interpretação que têm dos interesses dos Estados Unidos no Mundo. Foi sempre assim. Trump corta com essa perspetiva. Trump vem de uma outra escola, é um empresário. Não é um homem político e isso altera completamente o quadro. Há paradoxos extraordinários, por exemplo, terá sido o Presidente norte-americano mais pacifista em termos de política externa, muito apoiado na conceção do excecionalismo, e numa ótica da América para os americanos. Isto é um sinal também de que o modelo do ‘ator racional’ tinha algumas vulnerabilidades, ninguém acreditaria que um homem com aquele perfil alguma vez viesse a ser Presidente da maior potência, foi uma surpresa para os americanos. Tudo é uma grande surpresa”.

Este artigo foi publicado na edição de primavera da revista Líder

Tenha acesso ao dossier Guerra na Ucrânia – Act now for peace aqui.
Subscreva a Líder AQUI.

Arquivado em:Artigos

Líder, é mesmo isso que quer ser?

29 Março, 2022 by suporte

Se existe algo que a pandemia nos deu, ou pelo menos o deu aos que tiveram de ficar nas suas casas, com trabalho ou desprovidos dele, foi tempo. Tempo para ficar entre quatro paredes, muitas vezes mentais, e repensar o que tínhamos feito, e não feito, nas nossas vidas. Repensar a nossa profissão, a nossa experiência adquirida, os valores da empresa onde estamos, a valorização que esta nos dá, e a contribuição que, em conjunto, trazemos para um todo. Neste mesmo período, verificou-se um êxodo de colaboradores numa escala massiva, à qual deram o nome de “Great Resignation”, mas, até que ponto se trata “apenas” de um despedimento voluntário?

Ranjay Gulati, autor do livro “Deep Purpose”, deu como exemplo, num artigo publicado pelo Harvard Business Review, um amigo seu que resolveu demitir-se. Embora a razão não tenha sido aparente ao início, dado que parecia sentir-se realizado com a sua carreira, percebeu que se estava a tornar no tipo de pessoa que não queria ser, após entender que os seus valores e ideais não iam de encontro com os da empresa, ou a missão dela. Embora estas dúvidas crescentes possam ter sido suprimidas no início, a combinação de várias conjunturas pessoais e a pandemia, levaram-no a um mais intenso período de introspeção.

O autor relembra que muitos de nós entramos nesta espiral, e vemo-nos a considerar os nossos empregos com outra, e renovada, perspetiva, que conduz a uma tomada de decisão. Para Gulati, não é uma “Grande Demissão”, mas antes um “Grande Repensar”, onde os indivíduos procuram por trabalhos mais orientados para um propósito que os mova. Desta forma, resolveu conduzir entrevistas a mais de 200 líderes de forma a entender como estes trazem essa sensação de propósito aos seus colaboradores, acabando por descobrir estes pontos essenciais:

Conheça-se a si mesmo e o seu propósito

Tanto líderes como empregadores que se sentem realizados e pertencem a empresas de “propósito profundo” sabem o que querem fazer, e essa clareza tem-los movido a tomar certas decisões, e inspirado muitos outros a abraçarem os seus próprios propósitos.

Gulati invoca como exemplo a empresa KPMG, que lançou o programa “10.000 Stories Challenge”, convidando os colaboradores a fazer cartazes onde iriam destacar o propósito que os movia. Entre vários, um dos colaboradores, que tem prestado serviço a pequenos agricultores a garantir financiamento, escreveu: “ajudo as explorações a crescer”.

Será que precisa mesmo de um propósito no trabalho?

É natural procurarmos por algo significativo, tanto em contexto pessoal, como profissional. Muitos que definam como seu propósito ajudar o próximo a crescer e evoluir, conseguem fazê-lo fora do contexto profissional, seja como pais, mentores, fornecendo conselhos a amigos e familiares. Podem fazê-lo também de forma indireta ao trabalhar em empresas focadas na aprendizagem, ou de forma direta como educador ou professor.

O importante é entender as formas de como pode trazer e onde pode procurar o seu propósito de vida. Se estiver a cumprir o seu propósito fora do trabalho, até pode conseguir tolerar uma carreira mais leve de propósito, mas que ofereça bons benefícios. No final, lembre-se de seguir o que realmente lhe diz algo.

“Faça trabalho”

Se sente que precisa de um propósito no trabalho, comece por moldar o seu papel. Quais são as tarefas que pretende desempenhar? Com que tipo de colegas, clientes, gostaria de interagir? Qual o seu enquadramento mental do que está a fazer? O trabalho que não é tão significativo para si pode o ser para os outros? Quais os colegas que partilham as mesmas ideias e objetivos?

Avalie o seu chefe

Um bom chefe permite que os seus colaboradores expressem a sua individualidade, conectam-se com eles e fornecem-lhes uma sensação de comunidade e propósito comum. Pete Carrol, treinador dos Seattle Seahawks da National Football League, afirma “Se alguém sente que estás a reconhecer quem é e o que é, abriste a ligação para introduzi-los a um propósito coletivo”.

Dê atenção aos seus colaboradores

Algumas empresas são capazes não só de instituir objetivos organizacionais, como são também capazes de incentivar os colaboradores a unirem-se a esses mesmos objetivos e valores. No caso da empresa de tecnologia Ovia Health, adotou como valores “sejam vocês mesmos, sejam sinceros, sejam bondosos”, e é, através deles, que tem tomado decisões que incorporam ativamente as opiniões dos colaboradores, através, por exemplo, de fóruns onde estes podem abordar os seus hobbies pessoais e outros temas como inclusão e diversidade na empresa.

Se sente que a empresa onde está não vai de encontro ao seu propósito pessoal, é provável que queira partir para uma que vá. Por vezes, a mudança de cenário é o dar a oportunidade a que outras portas se abram. Lembre-se que é possível encontrar aquela sensação de propósito profundo no seu trabalho, mas não existem atalhos. A reflexão e o recuo também fazem parte da jornada da autodescoberta.

O nosso tempo neste planeta é limitado. Líder, do que está à espera para seguir em frente, e ser quem quer ser?

Arquivado em:Artigos, Leadership

Lyana Bittencourt, a empresária brasileira que aposta em Portugal

29 Março, 2022 by suporte

No Brasil, ainda há um longo percurso a fazer, principalmente no que se refere à participação da mulher em cargos de liderança, diversidade nas empresas e sustentabilidade, mas não é isso que impede Lyana Bittencourt, CEO no Grupo BITTENCOURT e Embaixadora do Capitalismo Consciente de continuar o seu projeto empresarial no país e agora também em Portugal, numa parceria com o Grupo Your. O seu objetivo é o mercado ibérico e considera que o nosso país pode beneficiar da experiência e maturidade do negócio de franchising brasileiro. Tem uma atitude empreendedora e consciente, e em entrevista exclusiva à Líder diz esperar dos” líderes de hoje que impactem o futuro da humanidade e não apenas o da sua empresa”.

 

Entraram em Portugal no ano passado através de parceria com o Grupo Your. O que procuram trazer ao mercado português com esta parceria e o que vos atraiu até esta empresa em concreto?

Entendemos que o mercado português é um mercado que tem ainda muito por explorar na área de franchising. Existe um enorme potencial para as marcas e para o investimento neste modelo de expansão. O Brasil está entre os dez principais mercados de franquias do mundo e é bastante maduro, sendo um exemplo para o desenvolvimento de tudo o que se refere a boas práticas no setor de franquias. Queremos apoiar as redes de retalho a expandirem as suas marcas internacionalmente e a desenvolverem novos conceitos de negócios que possam ser replicados de forma que sejam escaláveis.

No nosso planeamento estratégico sempre tivemos o objetivo de internacionalizar a nossa empresa e procurámos o momento e o parceiro ideais para isso. Assim fizemos uma joint-venture com o Grupo Your com foco no desenvolvimento do Grupo Bittencourt Europa. Procurámos uma empresa com sinergia de valores, cultura, propósitos e reconhecida no mercado português. Vimos que há muito que pode ser feito pelas empresas com a partilha da experiência acumulada por ambos os grupos. A nossa experiência dá-nos a certeza de que poderemos levar a nossa expertise e capacidade de inovação para o que podemos de chamar de mercado ibérico. A nossa expectativa para o mercado português é bastante elevada. É um mercado que ainda se pode desenvolver muito no que se refere ao franchising e a nossa expertise com mais de 35 anos neste setor, que pode em muito contribuir para a dinamização do mercado.

 

Sendo um dos objetivos levar a Bittencourt ao mercado ibérico, que características têm em comum estes mercados, Brasil, Portugal e Espanha?

Acima de tudo são mercados historicamente próximos e bastante abertos a novos modelos de negócio e com uma convergência de negócios com perspetivas de crescimento. Há uma proximidade cultural importante entre os nossos mercados, além da facilidade de comunicação que a língua permite, mesmo no caso de Espanha. O Brasil tem vindo a assumir uma relevância crescente face às novas dinâmicas do mercado internacional, fazendo com que seja cada vez mais importante reforçar as relações comerciais entre os três países.

A nossa estratégia é começar por Portugal, para depois evoluir para um mercado mais ibérico, assim como para outros países europeus. Estamos confiantes no potencial de desenvolvimento do mercado português, no sentido de potenciar a expansão de novos modelos de negócios de forma padronizada e escalável.

 

E no que mais divergem estes três mercados?

Além do evidente tamanho, escala e dimensão dos respetivos mercados, temos a questão do desenvolvimento e expertise deste setor. O franchising brasileiro tem muito para contribuir para as marcas presentes em Portugal e Espanha no que toca à capacidade de expansão de redes e internacionalização. Seja em termos, de profissionalização e boas práticas em desenvolvimento, gestão e expansão, porque graças à sua dimensão olha para esses temas de uma forma diferente dos países europeus. Na verdade, os três países têm expertise e inovações dispares, no entanto complementares.

 

Falando da pandemia, do conflito na Ucrânia, e das questões de sustentabilidade e alterações climáticas, como se podem as empresas reinventar-se para serem verdadeiramente sustentáveis e sobreviverem aos impactos? Quais os desafios e oportunidades que terão as empresas perante as atuais circunstâncias?

O principal é saírem do discurso e irem para a prática. Não há mais espaço para apenas falar e não agir frente aos problemas que existem no mundo pois as empresas conseguem de fato ter um impacto positivo nas questões sociais, ambientais e até mesmo nas políticas públicas ao fazerem pressão nos governos. O que esperamos dos líderes de hoje é que impactem o futuro da humanidade e não apenas o da sua empresa.

Uma forma de fazer essas questões saírem do papel é fazer com que temas como o ESG sejam efetivamente parte da estratégia e tenha o engajamento de toda a liderança da companhia. Não é uma questão de RH, mas sim da gestão de topo, dos decisores. É preciso inclusive gerar indicadores para acompanhar a evolução desses temas, metas para serem alcançadas e com uma linha temporal definida.

Os benefícios são muitos, como o envolvimento dos colaboradores, lealdade do consumidor, interesse de investidores e resultados em vendas. Há uma parcela grande de consumidores que dizem que pagariam mais por produtos que tivessem uma abordagem sustentável, a título de exemplo. As marcas estão sendo exigidas de se posicionarem e mostrarem sua contrapartida para a sociedade nesses temas.

A preocupação com o meio ambiente, com o social e com a governança é o que vai garantir a perenidade das empresas agora e ainda mais no futuro. Se essa tríade não for construída a tendência é a empresa perder relevância para o consumidor e sustentabilidade no mercado.

 

Fala-se de um novo tipo de consumidor. Quem é ele e quais são os novos hábitos de consumo?

O ambiente macro instável fez com que o consumidor tentasse neutralizar as suas preocupações, uma vez que muito do nosso quotidiano se alterou. Este novo contexto gerou uma certeza de que há a necessidade de se ter mais consciência e cuidado com o planeta e com o impacto que causamos no mundo. A informação agora é ampla e exige das pessoas uma elevação do nível de consciência sobre os problemas ambientais, sociais e econômicos

As pessoas agora tendem a se envolver pessoalmente na solução dos problemas sociais e/ou ambientais – querem fazer parte da solução e exigem das empresas um comportamento mais inclusivo. Os consumidores estão mais engajados com ideias e propósitos, desejam mais do um produto ou serviço, como motivo para consumir uma determinada marca.

Numa era vincada com questões de sustentabilidade e inclusão, que novos modelos têm as empresas de adotar para incorporarem esses valores na sua cultura e serem autênticas?

Muitas empresas, têm hoje criado novas posições de liderança para cuidarem especificamente deste tema, com a relevância necessária para as empresas. Novos cargos C-Level que passam a responder por resultados efetivos nas questões de sustentabilidade, impacto social e governança.

Uma forma de escalar essa iniciativa é contar com parceiros nesse processo, como fornecedores ou instituições que cuidam da reciclagem de produtos ou do fornecimento de energia limpa, ou equipamentos com baixa emissão de carbono. São muitas as iniciativas já existentes que por meio de parcerias podem acelerar o processo das empresas no que se refere ao ESG, é um movimento comunitário e não de atuação isolada.

Da mesma forma, ainda no que respeita a parceiras, iniciativas de open innovation, em que se permite a inovação aberta e colaborativa para a construção de iniciativas mais sustentáveis e socialmente responsáveis também são boas formas de escalar a agenda do ESG.

Uma questão de sustentabilidade importante que está na agenda das grandes empresas é o compromisso da neutralização da emissão de carbono – com metas agressivas de conquista da emissão de carbono zero, ou ainda emissão negativa de carbono.

 

É certo que muito temos falado globalmente sobre inclusão e diversidade, mas ainda somos testemunhas da disparidade social, laboral e económica entre homens e mulheres. Entre Portugal e o Brasil, acredita que algum deles tenha evoluído mais neste departamento? E de que forma podem as empresas e os líderes agir para consciencializar mentalidades?

No Brasil, ainda temos um longo percurso a caminhar principalmente no que se refere à participação da mulher em cargos de liderança, diversidade nas empresas e sustentabilidade. No entanto temos assistido a grandes empresas criarem programas de recrutamento e seleção de colaboradores exclusivamente para negros. Outras tem nas suas políticas internas programas de diversidade e inclusão que dão espaço para as pessoas discutirem abertamente sobre dificuldades e entraves que enfrentam no dia a dia profissional. O Brasil, pela sua dimensão e história, tem uma diversidade cultural incomparável com Portugal. Sendo natural que estes temas de diversidade e inclusão estejam mais desenvolvidos no quotidiano das empresas, no Brasil.

As novas gerações têm muito a ditar nestas políticas. As suas aspirações estão a transformar as estratégias das empresas em termos de recursos humanos, levando a que muitas organizações redefinam o seu propósito.

A conscientização vem da cultura que permeia a empresa, de como ela lida com esses temas de forma exequível e séria. Uma cultura que valoriza a diversidade e a inclusão e que é endossada pela liderança tende a promover a mudança nas pessoas. Importa que estes temas sejam tratados como um projeto da empresa, com metas e indicadores bem definidos.

Se pudesse dar um exemplo de liderança no feminino como inspiração para os nossos líderes, quem seria? O que podem os nossos líderes de hoje e amanhã aprender com ela?

Não tem como não falar da Luiza Helena Trajano, uma das lideranças femininas mais inspiradoras do Brasil e ouso dizer do mundo. Ela hoje é presidente do Conselho de Administração do Magazine Luiza, uma das maiores redes de retalho do Brasil e dona de um ecossistema de negócios que envolve soluções para o retalho de uma forma ampla. Além de ter sido responsável pelo crescimento do Magazine Luiza (hoje Magalu) empresa fundada por sua família que possui mais de 1.100 lojas em 18 estados brasileiros e que conta com mais de 47.000 colaboradores. Luiza adotou uma agenda de empoderamento feminino criando o Grupo Mulheres do Brasil, uma instituição apartidária e que fomenta o empreendedorismo feminino, a igualdade e a inclusão que hoje já tem mais de 100 mil mulheres participantes.

O programa inovador que citei de seleção de trainees exclusivo para negros também foi uma iniciativa do Magazine Luiza, muito influenciado pelo propósito de Luiza Helena de inclusão social.

Luiza ensina pelo exemplo, de mulher simples, acessível e que nunca se cansa de aprender para ser sempre melhor. É sinónimo de atitudes empreendedoras, inovação e criatividade em tudo que faz.

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O que pensa sobre Putin e sobre esta guerra o escritor ucraniano mais lido do país

28 Março, 2022 by suporte

Fálamos via Zoom, enquanto em Portugal ainda era fim de tarde e na Ucrânia era já hora de jantar. Andrey Kurkov estava na cozinha e de quando em vez percebíamos que a sua mulher se ocupava com os afazeres domésticos. Estava concentrado na conversa e também tenso pelo momento que se vive no seu país. Olha para a realidade de uma forma lógica e destemida, não havendo espaço para lamentações ou abordagens sentimentalistas, importa apenas falar e explicar o que se passa naquele país, interessa falar a verdade e explicar ao Mundo quem é Putin, quem são os ucranianos, o que justifica esta alarvidade que todos os dias vemos em direto nas televisões e redes sociais. Putin está velho, doente e enlouquecido. Passou dois anos fechado num bunker a ler e a escrever. Viaja sempre com a sua sanita para garantir que ninguém tem acesso aos seus dejetos e ao seu ADN. Na sua cabeça, o Mundo persegue-o e ele persegue o Ocidente, desafia a ordem das coisas, mata sem dó nem piedade, vive sozinho, não tem amigos, nem família. Andrey Kurkov é um dos escritores ucranianos da era pós-Soviética, mais lidos. Traduzido em dezenas de línguas. Nasceu na Rússia, fala e escreve em russo, mas é ucraniano. Fez parte do KGB, foi Guarda Prisional em Odessa e desde então que escreve. Escreve novelas, ficção, sátira. É também Presidente do Pen Ucrânia. Falou em exclusivo para a Líder.

Por: Catarina G. Barosa Fotos: Andrey Kurkov

Como se chegou até aqui, a esta situação terrível em que a Ucrânia é invadida pela Rússia?

Este é o desenvolvimento lógico das relações com a Rússia, porque a Rússia caminha para um regime autoritário extremo, e a Ucrânia caminha no sentido da democracia. A Ucrânia e a Rússia são países opostos, são estados de espírito opostos e mentalidades opostas. Putin não foi capaz de transformar a Ucrânia num novo estado satélite ou numa nova parte da Federação Russa, por isso decidiu destruí-la.

 

O objetivo é destruí-la? Como explicamos este conflito? Qual é a principal razão desta guerra?

Existem várias razões. Primeiro, Putin é velho e provavelmente morrerá nos próximos dois ou três anos. Ele quer ser lembrado nos livros escolares da Rússia como alguém que recriou a União Soviética ou criou um novo império russo como uma superpotência. É por isso que ele não se importa com quantos russos são mortos na guerra, com quantos oligarcas se tornam pobres, ele não se importa que a Economia esteja a cair. Para ele, o principal motivo é criar um Grande Império Russo e criar uma situação em que todos tenham medo da Rússia.

 

A maioria dos russos disse que concorda com Putin, que isto não é uma invasão. Mas acredita que a população russa está com Putin? Putin tem a confiança da população?

Por que não pergunta se concordo que 90% dos chineses concordam com Xi Jinping? Na Rússia não há imprensa livre, não há acesso a informação objetiva, não há televisão gratuita, rádio, jornais; não há acesso ao Youtube, Twitter, Facebook, Instagram. O povo está psicologicamente hipnotizado há 20 anos, acreditam no seu líder, pensam que a Rússia está rodeada pelo inimigo e o principal inimigo são os Estados Unidos e o segundo grande inimigo é a civilização ocidental. É claro que pensam que Putin pode defendê-los dos americanos, da promoção da homossexualidade, da música ocidental e de tudo o resto que não é apropriado e ortodoxo.

 

O Putin é louco? Alguns dizem que Putin é paranoico, será?

Ele é paranoico porque viaja com a sua própria casa de banho e com uma equipa especial que verifica que nada do que produz na sanita é roubado pelos americanos para verificar o seu ADN. Ele é louco, mas tornou-se mais louco nos últimos dois anos de Pandemia porque passou-os num bunker a ler e a escrever coisas. Não sabemos o que ele estava a ler e o que estava a escrever, exceto o artigo que publicou sobre a história russa e ucraniana, a explicar porque é que a Ucrânia deveria pertencer à Rússia.

 

Ele considera-se um czar?

(Ele) É um czar. É reeleito e será reeleito até morrer. Então, é o czar da Rússia. Toma as decisões. O Parlamento não tem qualquer papel. Tudo é decidido por ele.

 

Acha que ele tem ao seu lado muita gente de confiança?

Não.

 

Quem vai deter Putin?

Ninguém o vai parar porque ele não acredita em ninguém que o possa fazer. Só se encontra com Shoigu, o Ministro da Defesa. Talvez tenha mais um ou dois confidentes, mas não conhece mais ninguém pessoalmente.

 

Até a sua família?

Não tem família. A mulher divorciou-se dele há muitos, muitos anos e nem sequer falam ao telefone e não se encontram.

 

Está sozinho?

Sim.

 

No que diz respeito aos escritores na Ucrânia, antes desta guerra, qual era o seu papel, e o que podem fazer agora?

Bem, resumidamente, os escritores ucranianos sempre foram independentes da política ucraniana até 2004, porque o Governo e o Ministro da Cultura não se importavam com escritores e com Cultura, e os escritores também não se importavam com a Política na Ucrânia. A partir de 2004, na época da Revolução Laranja, alguns escritores ucranianos tornaram-se mais envolvidos politicamente. Então, começaram a fazer jornalismo e a dar cobertura a eventos públicos. A partir de 2013/14, a literatura ucraniana tornou-se muito mais militante, e, de facto, em vez de uma literatura, passámos a ter duas literaturas, porque pessoas que foram para as linhas da frente e que lutaram contra separatistas e russos, começaram a escrever diários, memórias, romances, contos, etc., então este povo criou literatura sobre a guerra, e agora temos mais de trezentos livros sobre a guerra em Donbass, temos mais de 400 mil veteranos de guerra em Donbass, e temos literatura tradicional ucraniana sobre sexo, drogas e Rock & Roll, e um pouco de Política também. A literatura na Ucrânia é escrita principalmente em ucraniano e em russo.

 

Escreve em que língua?

Em russo. Escrevo em russo, ficção em russo.

 

Porque estudou numa União Soviética?

Não, porque sou de etnia russa. Os meus pais eram russos, eu nasci na Rússia. Cresci na Rússia a falar russo.

 

Mas é ucraniano?

Sou cidadão ucraniano e politicamente ucraniano, sim.

 

O que acha de Zelensky?

Bem, não falava muito dele, não votei nele, não gostava dele. O que ele está a fazer agora está correto. Comporta-se como um estadista se deve comportar em estado de guerra.

 

Porque também escreve com humor e sátira, identifica-se com o seu Presidente quando ele era ator e comediante?

Desculpe, ele era um comediante de lixo, e o seu humor era, se é que conhece, do tipo do humor de Benny Hill, mas este era melhor do que Zelensky. Do tipo de comediantes ocidentais da Grã-Bretanha na década de 1970, que eram horríveis, mas eram amados por pessoas sem educação.

 

Por isso terá ganho as eleições com 73% de votos?

Sim, com 73%. Essa é talvez a percentagem de pessoas na Ucrânia que veem esse tipo de comédia, de shows. Eu pertenço à parte restante da população, que não vê isso.

 

Os ucranianos temem um ataque nuclear na Ucrânia levado a cabo pelos russos?

Após o desastre de Chernobil, os ucranianos não têm medo de ataques nucleares.

 

Mas falam sobre isso?

Não, na Ucrânia ninguém fala de ataques nucleares. Falam do perigo de Putin poder sabotar centrais nucleares perto de Zaporizhzhya, mas, quero dizer, não há pânico, não há medo, porque vivemos com o desastre de Chernobil durante 35, 36 anos.

 

Há também uma guerra de comunicação com a Rússia por causa da propaganda e informação falsa que esta dá ao Mundo? Zelensky tem de mostrar a verdade?

Zelensky não é a principal transmissão da verdade.

 

Diga-me outros nomes.

Não, não, não vou dizer-lhe outros nomes. Temos muitas ONG que estão a fazer esse trabalho de contrariar as informações falsas. Zelensky está a comunicar as suas mensagens sobre o estado do país. Ele não está a falar de informações falsas e todos os que são educados entendem o que é falso e o que é real.

Mas, com este tipo de informação, Zelensky todos os dias mostra o que está a acontecer no terreno.

Pode citar-me o que ele disse na sua comunicação, porque, pelo que sei, ele não está a lutar contra falsas informações, está apenas a dar apoio moral ao exército e a tentar inspirar as pessoas. Não é uma luta contra fake news ou guerra de informação. A guerra da informação é travada por meios diferentes. Não se pode comentar “todos os porquês” da Rússia. A Rússia está a mentir mil vezes por dia, enviando notícias falsas e informações falsas.

 

Acredita que irá haver paz?

Quero acreditar na paz, mas, a paz é quando se tem um acordo de paz. Não há um acordo de paz possível com a Rússia e, não sei o que pode parar a guerra, porque o compromisso que ele (Putin) quer é demasiado caro para o Estado ucraniano, porque, no final, a Ucrânia perderá a independência se a Ucrânia concordar com as suas condições.

 

Quais as consequências da continuação desta guerra?

Já temos uma grande parte do país destruída, e, na verdade, essa parte do país que está destruída são as regiões de língua russa, pelo que a maioria dos civis que foram mortos, no leste e no sul, são falantes russos e russos étnicos que Putin disse que tem vindo a defender. Ele não quer saber das vidas humanas, sejam elas russas ou ucranianas. Quer ocupar o país para o anexar como anexou a Crimeia. Não poderá fazê-lo com todo o país. Pode “morder outro pedaço”; quase ocupou o território da costa Azov para ter estradas para a Crimeia, que era o seu plano em 2014, mas não conseguiu fazê-lo. Quer ocupar Odessa, quer cortar acesso de Kiev ao Mar Negro e ao Mar Azov.

 

Acha que a anexação da Crimeia foi uma retaliação por causa da revolução feita por todos os jovens na Ucrânia em 2014?

Esta é claro a continuação de Maidan, sim. Maidan leva à anexação da Crimeia e à guerra em Donbass. A guerra em Donbass já era uma guerra com a Rússia, e agora é apenas uma fase muito maior desta guerra, ou a fase final, e precisamos decidir: ou a Ucrânia permanecerá independente ou a Ucrânia vai cair, e então 20 milhões de ucranianos irão para a Europa, outros permanecerão, e a Ucrânia tornar-se-á no distrito sudoeste da Federação Russa. Este é o plano dele, mas não acredito que vá acontecer.

 

O que pode a União Europeia fazer pela Ucrânia?

Bem, em primeiro lugar, enviar defesas aéreas, munições, armas, ajuda financeira, comida para todos e para o exército e ajuda aos refugiados ucranianos que vão para a Europa.

 

Mas se a Europa defende o céu da Ucrânia, começamos a Terceira Guerra Mundial, porque provavelmente a NATO terá de intervir?

O problema é que Putin já destruiu a reputação da NATO e dividiu a União Europeia. A União Europeia não tem uma única voz comum, porque a Alemanha quer comprar gás à Rússia, já estava a construir o gasoduto Nord Stream 2 com a Rússia quando os russos já estavam a matar ucranianos. Portanto, não existe realmente uma União Europeia.

 

Mas foi a primeira vez na história da União Europeia que esta decide rapidamente com ajuda militar e com as sanções económicas à Rússia. Acho que foi um sinal.

Foi um sinal de que a União Europeia acordou subitamente e compreendeu o que estão a negociar na Rússia. Berlusconi era o melhor amigo de Putin, Angela Merkel era como uma mãe para Putin, ela nem sequer andava a criticá-lo, mas na verdade ele era responsável por envenenar pessoas em Inglaterra e matar opositores chechenos para condená-los em Berlim.

 

E os Estados Unidos, o que acha da sua postura perante o que esta a acontecer?

Bem, eles são agora os maiores parceiros, estão a ajudar mais a Ucrânia do que a Europa; porque possuem melhores analistas do que a Europa, porque viram isto chegar antes de a Europa acordar, e estavam a fornecer informações ao Governo ucraniano e o Governo ucraniano não acreditava. Zelensky e outros diziam que a América estava a exagerar sobre os perigos da Rússia. Agora todos estão em silêncio sobre isto.

 

Provavelmente Zelensky, para fazer as negociações, terá de abdicar de fazer parte da NATO? Concorda?

Todos compreendem, e entenderam que a Ucrânia não aceitável para a NATO. Foi anunciado em 2008, na Cimeira da NATO de Bucareste, foi pessoal, pública e privadamente, muitas vezes dito pelos generais da NATO, que toda esta conversa é apenas política pública. Ninguém na NATO está à espera da entrada da Ucrânia, e Putin, claro, também sabia disto. Por isso, usou esse facto como pretexto para invadir a Ucrânia.

 

Está a planear ficar na Ucrânia?

Sim.

 

Até o fim?

Sim.

 

Quer dizer mais alguma coisa?

Este desenho de Putin, através da Rússia para a Crimeia, está quase a concretizar-se. E ele tem mais um sonho: unir a Rússia com a região de Kaliningrado, com a Prússia, com Konigsberg. E para isso, terá de cortar o caminho através da Lituânia e da Polónia,

e se a Europa não reagir à agressão da Rússia na Ucrânia, a NATO terá de reagir a este

futuro problema entre a Rússia, a Polónia e a Lituânia, e a Polónia e a Lituânia são membros da NATO. Por conseguinte, a NATO não evitará defender estes países.

 

Considera que, no futuro, a NATO tem de participar no conflito, porque tem de defender esses países?

Sim, a NATO deve preocupar-se com a reputação da organização que irá realmente defender os seus membros. Não sei se a Rússia decide atacar a Lituânia, mas se o fizer a NATO terá de reagir, mas irá reagir com força o suficiente para defender o país?

 

Está a escrever alguma coisa agora?

Estou a escrever artigos e ensaios para os meios de comunicação internacionais. Não estou a escrever nenhuma ficção.

 

Destaques

“Putin é velho e provavelmente morrerá nos próximos dois ou três anos.”

 

“O povo está psicologicamente hipnotizado há 20 anos, acreditam no seu líder, pensam que a Rússia está rodeada pelo inimigo e o principal inimigo são os Estados Unidos e o segundo grande inimigo é a civilização ocidental.”

 

“Ele é paranoico porque viaja com a sua própria casa de banho e com uma equipa especial que verifica que nada do que produz na sanita é roubado pelos americanos para verificar o seu ADN.”

 

“Não, na Ucrânia ninguém fala de ataques nucleares. Falam do perigo de Putin poder sabotar centrais nucleares perto de Zaporizhzhya.”

 

“Zelensky e outros diziam que a América estava a exagerar sobre os perigos da Rússia. Agora todos estão em silêncio sobre isto.”

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O efeito matrioska da comunicação: dos poderes dentro do poder, na inominável guerra da Ucrânia

28 Março, 2022 by suporte

Os conflitos bélicos travam-se nos campos de batalha, nos espaços que a tática e a geoestratégia definem, desenham, adaptam e também a inteligência estratégica, a segurança e a diplomacia desenvolvem e consumam. Às frentes de batalha junta-se um poder, já enunciado como o quarto, para além dos três clássicos de Montesquieu, no seu Esprit des Lois, publicado em Genebra, em 1748, sem nome de autor, para contornar a censura e proteger o autor. Montesquieu tratou das diferentes formas de governo (monarquia, aristocracia, república e despotismo) e das suas leis, e refletiu sobre a necessidade da separação dos três poderes essenciais do Estado: o das leis, o da governação e o da justiça. Aos três poderes fundamentais do Estado, somar-se-ia um quarto, um poder que, na sua ideal dimensão e missão de equidistância e distanciamento entre poderes, mais seria um “contrapoder”. No seu significado e papel fundamental, no século XIX, a funcionalidade do quarto poder ganhava projeção a partir do pensamento de Thomas Macaulay e por Thomas Carlyle, que indiciam o papel de guardião da imprensa dos cidadãos contra os poderes abusivos e autocráticos. Este quarto poder, o da imprensa, seria o contrapoder, ou na prática o verdadeiro poder, o que representaria todos os cidadãos e permitiria equilibrar o poder sufragado, por poucos num século XIX, e emanado dos parlamentos. Contudo, este poder, o da informação e da imprensa, só poderia manter a sua autonomia e fiabilidade quando executado de forma neutra, independente, informativa e não ideológica ou manipulada por qualquer outro dos poderes, especialmente, o poder executivo.

O poder da informação, enquanto poder moderador, na linha de Benjamin Constant, em 1819, Sobre a Liberdade dos Antigos Comparada com a dos Modernos, contrapunha a liberdade dos antigos, em moldes republicanos, de influência direta mediante o debate público à liberdade dos modernos, suportada nas liberdades civis e na vigência da Lei. Esta última seria, contudo, limitada à deliberação dos parlamentos e à inerência da representação coletiva. Antes, já Jean-Jacques Rousseau (1762) indicava que as propaladas virtudes da representação parlamentar eram, na prática, menos indiciadoras de verdadeiras liberdades do que o esperado. Vaticinava este, no Contrato Social, sobre a condição limitada do povo (inglês), o qual, após a eleição mais não seria do que escravo, sendo livre apenas no dia da eleição.

Deste breve périplo acerca de alguns dos fundamentos dos poderes e pilares seminais do Estado de direito democrático, sobressai a importância do poder da informação, na sua permanente missão, monitorização e auscultação pública, à luz do princípio da independência entre poderes. A questão que se coloca é: qual o poder da imprensa quando o espaço do povo é, por circunstâncias imperativas, subtraído e substituído pela imposição marcial da condução do Estado?

Observar a guerra na Ucrânia é ter a capacidade de entendimento que os poderes políticos em contenda, que operam no palco do conflito são ambos, Ucrânia e Rússia, partes, fortemente, interessadas na construção da narrativa da guerra. Salvaguarda-nos o quarto poder, esperamos. E este poder só pode ser, verdadeiramente, imune às pressões dos palcos, onde se instalam os conflitos, quando ainda existe uma réstia de salvaguarda democrática (a que emana do poder do povo), que permita aos jornalistas que exerçam a sua profissão e missão de prosseguir a verdade noticiosa que o façam em liberdade. O poder da informação assemelha-se a um poliedro que espelha, com maior ou menor amplitude de focagem, com maior ou menor reflexo e luz, os tons e dimensões dos objetos/conteúdos que capta ou lhe são permitidos captar. O poder da informação espelha os objetos que capta e dissemina-os em horizontes, explicados numa hipótese de agenda setting, cujos moldes de enunciação dependem, essencialmente, dos contextos, das culturas cívicas e políticas, e da maior ou menor capacidade de descodificação, simpatia e interesse das comunidades pelos conteúdos espelhados.

No plano da comunicação, e sem surpresas, e num tempo de recursos tecnológicos poderosos, a guerra e a invasão da Ucrânia, pela Rússia, tem feito sobressair dois modelos de informação, reforçados em tempo de guerra, nestes dois países. Um modelo de informação, tendencialmente, centralizado e controlado pelo Estado, na Rússia, e outro modelo de informação, tendencialmente, plural, que se reinventa e se adapta, a cada momento, na Ucrânia. Os dois modelos têm em comum o serem dirigidos pelos seus protagonistas no poder, Putin e Zelensky. Se o segundo permite a existência de múltiplos canais e possibilidades de cobertura noticiosa, nacional e internacional, o primeiro acentua o controlo e não permite pluralidade noticiosa. Nos primeiros dias de guerra, a restrição (bloqueio) do acesso da BBC World News e várias organizações noticiosas como a Deutsche Welle, assim como do Twitter e Facebook, por parte da Federação russa, constituem exemplos de decisão de fechamento noticioso e de comunicação da Rússia ao Ocidente. O argumento usado foi o de aqueles órgãos e plataformas fornecerem uma visão parcial dos acontecimentos. Atualmente, na televisão russa, o principal canal público, o Canal 1 (Первый канал, Pervyy kanal), continua a passar programas de debate, em especial um programa diário de grande audiência (O tempo vai revelar – время покажет – vremya pokazhet), no qual, todos os dias se discute um tema, com vários convidados, ultimamente sobre a “operação especial na Ucrânia”. O programa caracteriza-se pelo tom assertivo do jornalista que o conduz e pelo empolgamento de alguns dos convidados, no debate que se instala, à luz do mote e tema de cada programa (normalmente, centrado nas notícias da atualidade internacional, na relação de outros países com a Rússia, com convidados internacionais, incluindo americanos). Desde o início da designada “operação especial russa” (como sabido, a palavra “guerra” não pode ser usada na Rússia), este programa tem tratado as opções que a Rússia entende como legítimas para desencadear o conflito: salvaguardar a Rússia em relação às “forças nazis da Ucrânia”, “instaladas no poder e na sociedade ucraniana” (a Rússia dá como exemplo um dos heróis nacionais da Ucrânia, Stepan Bandera, como expoente do extremismo ucraniano). Enfatiza-se e justifica-se o hipotético “direito” separatista e o conflito nas regiões do Donetsk e Lugansk, que dura desde 2014 e teria provocado o “genocídio” das populações russas naquelas regiões, sem que o “Ocidente se importasse”. Justifica-se a intervenção militar na Ucrânia à luz do “direito” separatista naquelas regiões. Focam-se e justificam-se “operações militares” russas, algumas que não chegam a ser noticiadas no Ocidente e culpabiliza-se a Ucrânia pela intervenção russa. Não se trata a extensão do conflito, a nível armado, o nível de devastação humana, os milhões de desalojados e refugiados e a destruição que assolam a Ucrânia. Os dissidentes ao regime consideram, essencialmente, propaganda a informação passada nos canais russos. A cobertura noticiosa limitada e seletiva dos assuntos e o delito de informação em que os jornalistas e os restantes cidadãos podem incorrer, se veicularem mensagens “subversivas e contrárias à ordem russa”, dá-lhes razão.

Atualmente, na Ucrânia, existem emissões de, sobretudo, dois canais de televisão. Os restantes canais estão a reemitir estes dois canais. Fornecem informação sobre o curso dos acontecimentos e reproduzem os vídeos publicados do Presidente Zelensky, nas redes sociais, pelo menos, um vídeo por dia. O Twitter, em particular, é o suporte de comunicação por si mais utilizado para comunicar com a população ucraniana, em território nacional e fora da Ucrânia, e com a comunidade internacional. A sua intervenção tem sido diária, e centra–se em apelos ao apoio da comunidade internacional, sobretudo, nos planos estratégico e económico e, em especial, no agravamento das sanções económicas à Rússia. A popularidade, estilo enfático e emocional de comunicação de Zelensky realçaram a sua notoriedade política e contrastam com o estilo distante, aparentemente “neutro”, frio e institucional de Putin. Neste momento, Zelensky tem total apoio dos media (sobretudo televisão) ucranianos, que ainda sobram, e a sua mensagem é passada, por estes, como um ato de resistência e heroísmo, não de propaganda.

Perante o Ocidente, no espaço e poder da comunicação, a que se alia a mobilização das opiniões públicas ocidentais, num contexto de guerra como o que se vive na Ucrânia na atualidade, do poder de comunicação espera-se o desafio da neutralidade. Contudo, esta expectativa tem como pano de fundo a ingerência de um Estado sobre outro, a que se soma um rasto de destruição devastador e irreparável. Para se equacionarem os poderes em perspetiva e quanto ao equilíbrio da balança de poderes, entre o executivo e a informação, em tempos de guerra, o poder da informação pode ser equidistante e independente mesmo quando o poder executivo tem interesses que incendeiam, abatem, dizimam e se digladiam nas ruas. E sobretudo por isso. Nestes tempos de guerra, a expectativa é a da reposição rápida da paz. E essa não será uma missão da informação, mas esta é um dos recursos que concorrem para que a paz se alcance. No curso dos acontecimentos nesta guerra da Ucrânia, a informação tem-se revelado eficaz enquanto capacidade instrumental e motor de mobilização de uma das partes do conflito, a Ucrânia. Será o bastante para trazer a paz? Conseguiu-se que o quarto poder marcasse a história da Humanidade em anteriores conflitos e guerras. Esta não será exceção.

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Uma visão otimista no mercado de trabalho em tempos de pré-conflito

28 Março, 2022 by suporte

O início do ano teve um arranque positivo no que toca a perspetivas saudáveis de criação de emprego, sendo que, no prognóstico do segundo trimestre, 44% dos empregadores nacionais esperavam aumentar as contratações, e apenas 15% validava diminuir a sua força de trabalho. Estes são algumas das conclusões apresentadas pelo ManpowerGroup no seu relatório “ManpowerGroup Employment Outlook Survey” do segundo trimestre de 2022, conduzido através de entrevistas a 504 empregadores ao longo do mês de janeiro.

Embora as perspetivas, no seu global, sejam positivas, os resultados não refletem os impactos do conflito na Ucrânia. Rui Teixeira, Chief Operations Officer do ManpowerGroup Portugal, revela que, nesta análise pré-conflito, “o sentimento dos empregadores era muito positivo”, ressaltando que, apesar de já serem visíveis desequilíbrios nas cadeias de abastecimento e da pressão inflacionista, tanto em Portugal como os seus principais parceiros económicos, conseguiam perspetivar um desenvolvimento da atividade e necessidades de talentos, resultante do levantamento das medidas de combate à pandemia.

Os conflitos vieram agravar os sinais de incerteza. O Banco Central Europeu já veio a confirmar a subida da inflação e a redução do PIB da zona Euro. Rui Teixeira prevê que as políticas a visar o limite dos impactos nos setores mais vulneráveis aos preços dos combustíveis, matérias-primas e energia, sejam capazes de aliviar os seus efeitos na economia e na criação de postos de trabalho.

Eis algumas das conclusões do relatório:

Planos de contratação mais ambiciosos em todos os setores industriais

A nível global e independentemente do setor, incluído os mais afetados pelas medidas de contingência, os empregadores portugueses esperavam expandir as suas equipas durante os próximos três meses. No caso do setor da Hotelaria e Restauração, regista-se uma projeção de +43% no crescimento nas contratações. Já no Comércio Grossista e retalhista, também gravemente afetado pela pandemia, regista uma subida de um ponto percentual, numa projeção de +37%.

Por outro lado, o setor da Banca, Finanças, Imobiliário e Seguros, apresenta uma projeção de +25%, caía 23 pontos percentuais comparativamente aos três primeiros meses do ano.

Pequenas e grandes empresas com mais intenções de contratar

As empresas que anunciavam um ritmo mais próspero de contratação eram as Pequenas, numa projeção para a criação líquida de emprego de +33%, e as Grandes, numa projeção de +31%.

Embora positivo, mas não tão expressivas comparativamente, as Microempresas e as Médias empresas também previam o reforço das suas equipas, com as projeções de +19% e +25%, respetivamente.

O Grande Porto tem as previsões de contratação mais otimistas

No geral, as regiões de Portugal apresentavam crescimentos nas contratações, todavia, é a região do Grande Porto que mais se destaca, com +43%, no que resulta 11 pontos percentuais acima das projeções do primeiro trimestre de 2022. Para a Grande Lisboa, a projeção situa-se nos +29%.

A região Norte é a que apresenta uma projeção mais baixa, embora ainda favorável, de +19%, resultando numa diminuição de 22 pontos percentuais comparativamente ao primeiro trimestre de 2022.

Globalmente positivo

Dos 40 países e territórios analisados no estudo, em que foram entrevistados mais de 41.379 empregadores, 39 países anunciaram reforçar os planos de contratação de talentos entre abril e junho, embora se verifique um abrandamento face ao primeiro trimestre. O Brasil é quem apresenta maior projeção, rondando os 40%, seguido da Suécia e da Índia, ambas com 38%. Portugal regista os 29%.

O próximo relatório será divulgado no mês de maio e contará com as expectativas para o terceiro trimestre, devendo englobar os impactos do conflito na Ucrânia.

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