Anda no ar a ideia de uma nova ordem mundial. Os proponentes são a China – não mais uma economia emergente, mas o novo superpoder – e a Rússia – o antigo superpoder em fase de denegação nostálgica e imperialista. A ideia tem defensores no Ocidente, nomeadamente as forças anti-americanas e anticapitalistas. É necessário, defendem, pôr fim ao modelo neoliberal. A geopolítica, que Miguel Morgado trata em Guerra, Império e Democracia (Dom Quixote), voltou à ordem do dia.
O capitalismo tem muitos defeitos mas muitas das suas imperfeições podem ser mitigadas por Estados competentes. A versão neoliberal serve de nêmesis para tudo e para todos, desde os detentores dos meios de produção que querem ver o Estado à distância a alegados abusadores sexuais em apuros. O capitalismo temperado pelo Estado continua a ser preferível às soluções alternativas apesar dos devaneios antiamericanos e dos muitos bónus que os EUA, sede por excelência do capitalismo global, têm dado aos seus inimigos – o presidente Trump, a retirada atabalhoada do Afeganistão, uma diplomacia da preleção democrática sem o impacto material da abordagem chinesa.
Em todo o caso, uma nova ordem liderada pela China e pela Rússia parece uma proposta assustadora: uma combinação de hard power (China) e ressabiamento (Rússia) apoiada por um pequeno núcleo de ditadores. Custa ver o presidente do Brasil arrastar o seu país para este plano. A posição em relação à Ucrânia é lapidar: quer promover a paz com o apoio de quem não quer parar a guerra. Convinha que não esquecesse o que tem vindo a ser referido por vários analistas, como Nuno Severiano Teixeira: se a Rússia parar de combater, a guerra acaba; se a Ucrânia parar a Ucrânia acaba.