A semana que passou foi fértil em discussões e perfis sobre a saúde mental de Putin. Como seria expectável, uns defendem que o ditador russo está são, ao passo que outros explicam que estará mentalmente perturbado. Não pretendendo traçar um perfil, para o que nem estou habilitado, proponho outra explicação: e se Putin for mais um caso de hubris?
Hubris é a palavra que os gregos usavam para referir a doença dos poderosos. Eis a ideia: o poder sobe à cabeça e altera a maneira como pensamos. A habituação cria potencialmente grande desinibição, levando os poderosos à aprendizagem de que tudo lhes é permitido. Nos casos mais graves acabam mesmo por desenvolver um pensamento messiânico, que lhes atribui o poder, quasi-divino, de completar uma missão de fundamental importância. Estes personagens tornam-se particularmente destrutivos quando o seu comportamento gera a ideia de que são alvo das maiores conspirações.
O mundo está infelizmente cheio de vítimas da hubris. Putin será o caso mais visível, mas Trump foi-o também, tal como tratado por David Owen em Hubris: The road to Donald Trump. Na Etiópia Abiy Ahmed repete o padrão. Nas empresas, é possível que muitos escândalos recentes tenham sido precipitados pela patologia hubrística. A doença não pode ser erradicada porque nós, humanos, somos vulneráveis às tentações. Mas pode ser mitigada com uma medicina eficaz: boas instituições, com pesos e contrapesos. Colocar todos os ovos no mesmo saco é o maior dos males, como o caso russo atesta.
PS1. A Rússia até pode ocupar toda a Ucrânia mas já perdeu a guerra. Não desuniu a Ucrânia nem o Ocidente. Provou a Putin quão errada era a sua ideia de que a Ucrânia não é uma nação. Putin fez do seu país um Estado pária, apenas apoiado pelas piores companhias. Uma desgraça.
PS2. Os exemplos de coragem dos militares e dos cidadãos comuns ucranianos são inesquecíveis. Os dos russos que se manifestam contra o ditador também. Para a História guarda-se o exemplo de Elena Osipova. Aos 77 anos, mostrou que a coragem não escolhe idades. Um exemplo para todos.
PS3. Não tomemos a nuvem por Juno. Tolstoi continua a ser recomendável e a comunidade russa que cá e lá vive não cometeu nenhum crime. Os cidadãos não são o regime.
PS3 Noutro domínio, partiu Mark Lanegan. A sua música fica connosco. Blues Funeral é um dos dez ou vinte discos da minha vida. Obrigado, Mark.